NO OCULISTA [Edição 91]

 

X-8, o detetive etimológico, está sentado à escrivaninha de seu escritório num bairro que, de tão sujo, nem tem nome. Está corajosamente aguardando que cheguem as palavras-clientes desta noite.

Ei-las que entram, titubeantes, ansiosas por saber de suas origens, com o dinheirinho no bolso para pagar o famoso profissional.

Quando a última fecha a porta e senta, o bravo detetive as encara com sua voz gélida de ator de filme noir e dispara:

– Boas noites, prezadas palavras. Estamos aqui reunidos para falar sobre as origens de vocês, todas relacionadas ao material que usamos para limpar nossos lares e locais de trabalho.

Para iniciar, destaco ali a palavra limpeza. Ela vem do Latim limpidus, “transparente, claro, nítido”, do Grego lampein, “reluzir, brilhar”.

A palavra enrubesceu de orgulho.

– E tem mais, esse verbo grego originou também o nome do objeto sujo de moscas que ilumina esta sala, a lâmpada, cuja função é justamente brilhar.

As demais palavras se maravilharam.

Prossegue o detetive:

– A seguir, aponto ali nossa conhecida vassoura, que veio do Latim versoria, derivada de verrere, “varrer, arrastar pelo chão, ajuntar por meio de varredura”. Esse é um dos implementos mais antigos da Humanidade, pois um galho maior com diversos galhos menores atados na ponta certamente era usado para varrer as cavernas em épocas antigas, livrando-as de todos aqueles ossos de mamutes, pontas de flechas usadas e restos de fogueiras.

Ao lado de vassoura senta-se esfregão, que vem de esfregar. Esta deriva do Latim exfricare, “roçar com energia”, de ex-, “para fora”, mais fricare, “espalhar, esfregar”, do Grego khríein, “ungir, espalhar”.

Fazendo uma boa dupla com ela, encontramos escova, mostrando suas cerdas para o mundo; ela vem do Latim scopa, “vassoura”, inicialmente “arbusto, conjunto de ramos de planta”, que eram usados para preparar objetos de limpar e varrer, como dissemos há pouco.

Quem se encontra nessas atividades sempre acaba usando um pano; esta vem do Latim pannus, “pedaço de tecido, trapo” do Grego penos, de mesmo significado.

Em vez deste se pode usar uma esponja para limpar. Esta vem do Latim spongia, do Grego spongia, o nome de um animal marinho fixo, que mais parece uma planta. Ele é colhido há muito tempo por ser macio, elástico e poroso, muito adequado para retirar umidade de uma superfície.

Até algumas décadas se encontrava esse material natural para vender em nossos mercados, mas agora ele é feito de derivados do petróleo, que são mais baratos e mais coloridos.

Nossa amiga espuma ali está inquieta. Pois bem, chegou a sua vez: você deriva do Latim spuma, de mesmo significado, de spuere, “ejetar, vomitar, lançar”.

Temos entre nós também uma palavra composta, pedra-pomes. Ela está meio desanimada, coitadinha, pois se encontra meio fora de uso atualmente. Ela é uma pedra vulcânica bem porosa, que foi usada por séculos para alisar a pele. Seu nome vem do Latim pumex, que parece ter uma origem em comum com a palavra que originou espuma.

Ao falar em espuma, não pude deixar de notar que sabão deu mostras de assanhamento. Cara palavra, sua origem é o Latim sapo, “sabão”, que veio de uma palavra germânica saipo-, “material para lavar ou tingir o cabelo”. Houve certa confusão num texto do historiador romano Plínio, que fazia referência a uma espécie de mistura de resinas que os gauleses usavam; o nome acabou sendo aplicado ao material usado para lavar e assim ficou.

Todas as prezadas clientes podem ver detergente, de braço dado com sabão. A diferença entre os dois materiais é apenas de ordem química, da matéria-prima usada; a ação final delas é a mesma, ou seja, a de soltar moléculas de gordura de onde elas estão presas. Sua origem é o Latim detergere, “lavar fora” de de-, “para fora”, mais tergere, “esfregar, remover”.

O pessoal ali do fundo está meio agitado, de modo que vamos resolver as suas curiosidades.

Olhem para a redondez satisfeita de balde. Espero que você não fique incomodada, cara cliente, mas devo informar que a sua origem ainda não foi explicada.

Mas não se amofine, observe que isso a deixa misteriosa, com um certo ar de atração fatal.

Balde pensou um pouco e acabou concordando. Palavras são assim, muito vaidosas. Qualquer argumento é capaz de dominá-las.

O grande profissional, satisfeito por ter evitado um ataque de nervos àquela palavra, voltou-se para outra:

– E você, bacia, que tem tantas utilidades, vem do Latim baccinus, “recipiente largo para líquidos”.

Com grande afinidade com vassoura, nota-se ali rodo. É um instrumento de grande utilidade, usado para retirar água dos pisos. Vem do Latim rutrum, “instrumento para trabalhar a terra, espécie de enxada”.

Falando em pisos, podemos citar cera. Você, que deixa nossos assoalhos lisos e brilhantes a ponto de às vezes escorregarmos neles, vem do Latim cera, do Grego kéros, ambos querendo dizer “cera” mesmo.

Uma parente sua é querosene, embora não pareça. Esta veio do Francês kérosène, de kéros.

Na fila dos fundos senta-se uma dupla de nomes estranhos e mesmo significado: são lixívia e barrilha.

Todas representam uma solução de hipoclorito de sódio com finalidades alvejantes e bactericidas. A primeira vem do Latim lixivium, “líquido coado”.

A segunda é do Espanhol barrilla, o nome de uma planta cujas cinzas produzem o sódio necessário para a preparação do líquido de limpeza; ele vem de barra, por sua vez uma alteração de parra, “vinha, a planta de uva”, por ela ser disposta no terreno como as vinhas. As duas são também conhecidas como “água sanitária”.

Caras amigas, nossa sessão está terminada. Ao saírem, se puderem dar uma limpada em nossos corredores pouco asseados, o condomínio ficará agradecido.

 

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