SINAIS DE PONTUAÇÃO [Edição 84]

 

O Detetive das Palavras, X-8, se encontra em seu escritório cuidadosamente empoeirado, à espera do grupo que havia marcado consulta para esta noite.

Ao ouvir passos muito leves se aproximando pelo corredor sujo, ele percebeu que era o seu grupo de clientes que se aproximava. Quando bateram à porta, ele mandou entrar.

O pessoal entrou, cumprimentando timidamente, e se espalhou pelos bancos em gente à escrivaninha de nosso herói.

Hoje ele não estava recebendo palavras atrás de suas origens, ele estava à frente de sinais de pontuação atrás de sua origem.

Eles também tinham seu papel  –  importantíssimo, aliás  –  na escrita e tinham o direito de saber de onde vinham.

Contanto que pagassem bem e à vista, claro.

Todos acomodados, X-8 pigarreou e começou a falar:

– Boa noite a todos. Antes de entrar nos casos individuais, vamos relembrar algo sobre os sinais de pontuação. Para começar, em muitas escritas não se usava nada com essa finalidade. É o caso do Fenício, do qual se originou nosso alfabeto ocidental. Ele usava pouquíssima pontuação, além de não ter vogais nem separação entre as palavras e tampouco maiúsculas.

Enquanto o idioma escrito servia basicamente para registros comerciais, estava tudo funcionando bem. Mas, quando os gregos começaram a se dedicar à arte da retórica, tiveram que inventar sinais que marcassem as durações das pausas, a entonação, o ritmo. Aí é que vocês, prezados clientes, começaram a existir.

Vamos começar sem delongas ali por ponto.  Você, tão minúsculo, e de tanta importância  –  o sinalzinho pareceu dobrar de tamanho  –  tem o seu nome derivado do Latim punctus, “ponto, picada”, particípio passado de pungere, “fincar, espetar, picar”.

Do seu lado vemos a inseparável vírgula, que em Latim se diz virgula, igualzinho ao uso atual, e que é um diminutivo de virga, “varinha”, pois alguém algum dia a achou semelhante a um galhinho flexível.

Junto com vocês se encontra um derivado de ponto, o ponto de interrogação.

Bem, a história sobre a sua origem diz que você vem da abreviação latina para quaestio, “interrogação”, que era qo e passou a ser representada como um pequeno “q” minúsculo no fim da frase, colocado sobre um pequeno “o”. Com o tempo, este teria virado um ponto e o “q”, o sinalzinho curvo que conhecemos.

Infelizmente, parece que não há achados em documentos antigos que atestem a veracidade dessa história, apesar de ela ser bem interessante.

Por ora, a hipótese é de que você descenda de um sinal inventado no século  VIII, que originalmente tinha uma linha em ziguezague sobre um ponto. Mais tarde ela seria trocada por uma linha com curvas. Mas não se amofine, o seu uso persistirá enquanto a Humanidade tiver alguma pergunta para fazer.

Do seu lado está o ponto de exclamação. Segundo os estudiosos, sua origem é a exclamação de alegria latina io, que acabou sendo condensada numa barrinha vertical sobre um “o”, o qual depois virou um ponto.

Agora podemos atentar para o ponto-e-vírgula que está ali abanando o rabinho. Você é um dos poucos sinais cuja invenção está bem determinada e datada. Nasceu nos termos atuais em 1494, por invenção de um italiano chamado Aldo Manuzio, intelectual e impressor.

E aqui temos o sinal chamado dois-pontos, usado para indicar uma fala direta, uma explicação ou uma citação. Não precisamos falar de sua etimologia, pois ela é óbvia. E devemos confessar que o seu surgimento é meio nebuloso, parece que foi aí pelo século XV. No início, sua função não era tão bem definida como agora, você servia também para substituir o ponto final.

Um ponto, dois… faltam os três pontinhos, que nos olham fixo na ponta daquele banco. E que atendem também pelo nome de reticências, do Latim reticentia, “silêncio”, do verbo reticere, “manter-se quieto, fazer silêncio”, que se forma por re-, intensificativo, mais tacere, “calar, não falar”.

Isso porque o sinal muitas vezes indica um pensamento incompleto, como se o autor estivesse querendo calar alguma coisa.

Agora chega a vez de apóstrofo, aquela virgulinha que se usa no alto da linha para indicar a supressão de uma letra, como em “caixa d’água”. Seu surgimento se deu no século XVI, no Francês. Seu nome vem do Grego apostrophos, “ato de virar, de afastar”, formado por apo, “para fora”, mais strephein, “virar”.

Isso porque ele era usado para eliminar uma vogal no final de uma palavra, para evitar que ela se ligasse à vogal inicial da seguinte e formasse um hiato. Na França eles não se chegam em hiatos. Enfim, era para mostrar que uma palavra “virava” em relação a outra.

E vemos ali aquele sinal que parece um algarismo 8 inacabado, que é um sinal que significa et, “e”, em Latim. Trata-se do ‘E’ comercial. Olhando bem para ele, conforme a fonte em que ele foi escrito, dá para enxergar que se trata de um “E” com um “t” bem pequenininho junto.

É o que restou de um sistema de cerca de 3000 sinais para estenografia inventado por um romano chamado Marcus Tirus, no ano de 63 AC. Tal sistema esteve em uso por mais de 600 anos, o que mostra que ele não devia ser dos piores.

A seguir vamos contar que a barra, ali, é um sinal que se usa para separar números em datas. Tem-se usado também, imitando o idioma inglês, para dizer “ou”, como em “masculino/feminino”.

Seu nome vem do Latim barra, “tranca de porta, travessa”.

Para finalizar, olhem para o sinal de percentagem que mostra os dois zeros de “100”, separados por uma barrinha.

Até o século XIV se usava para definir uma percentagem a abreviatura italiana per cento, pc, p100 ou per 100. Lá pelas tantas o pc foi sendo alterado  até terminar no sinal atual, por sinal que bastante expressivo.

Por esta noite o espetáculo cultural terminou, prezados clientes. Estarei sempre aqui para dirmir suas dúvidas, contanto que marquem hora e paguem adiantado. Uma boa noite!

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