Palavra acusar

Criminosos

Todos os dias encontramos notícias que nos informam sobre processos investigativos que levam à prisão dos criminosos. Infelizmente, os grandes, aqueles que prejudicam um povo inteiro, têm mecanismos que os resguardam de maiores sanções.

Há todo um universo de palavras para veicular as ações envolvidas nesses procedimentos. Vamos agora esmiuçar umas poucas.

DESCONFIANÇA – muitas vezes uma investigação começa com base nesta. Tal palavra vem de “des-“, indicando “inverso, para trás”, mais o Latim confidere, “confiar”, formado por com-, intensificativo, mais fidere, “acreditar, ter fé”, de fes, “fé”.

Logo, quando deixamos de ter fé em alguém ou numa instituição, é hora de avaliar para ver se temos razão ou não.

SUSPEITAR – vem do Latim suspicere, “suspeitar, desconfiar”, formado por sub-, “de baixo”, mais specere, “olhar”. Significava “olhar disfarçadamente”, portanto, “desconfiando”, “não acreditando”.

CHEIRAR MAL – é uma expressão que diz tudo. Se se tentar ocultar um cadáver, ele vai espalhar o cheiro da decomposição e atrair até ele outras pessoas.

O cheiro não precisa ter bases químicas, como neste caso. Pode-se tratar, por exemplo, de uma capacidade financeira incompatível com os ganhos declarados de uma pessoa.

COM A BOCA NA BOTIJA – muitas vezes, em épocas antigas, os patrões tinham problemas com os criados beberrões que não resistiam a dar uma provadinha no estoque de bebidas. Os senhores podiam descobrir o criado praticando respiração boca-a-boca na botija, um recipiente para bebidas cujo nome vem do Latim butticula, diminutivo de buttis, “odre, vaso”.

Equivale a um flagrante definitivo.

Falando nisso, em Inglês há expressões muito interessantes para tal, como RED-HANDED, “com as mãos vermelhas”. Descreve uma pessoa que foi encontrada com as mãos ainda manchadas pelo crime que acabou de cometer.

Eles também podem dizer, passando da arma branca para a de fogo, que o criminoso foi descoberto com o SMOKING GUN, “com a arma fumegante”, isto é, visivelmente ligado aos meios de cometer o crime.

ACUSAR – uma pessoa pode ser acusada de uma desobediência à lei. Essa palavra vem do Latim accusare, “chamar a juízo”, formada por ad-, “contra”, mais causari, “apontar como causa, como motivo”, de causa, “razão, motivo, causa”.

PROVA – se apenas acusar bastasse para uma pessoa ser processada, o mundo estaria numa confusão tremenda. Para que se chegue à conclusão de culpa, é necessário provar as más ações do possível criminoso.

A legislação o considera inocente até que se prove o oposto. Felizmente estamos longe do Código Napoleônico, um conjunto de leis no qual o acusado era culpado de saída e a ele cabia provar a inocência.

Provar vem do Latim probare, “testar, demonstrar ser de valor”, de probus, “valoroso, bom, virtuoso”, que vem do Indo-Europeu pro-bhwuo-, “estar à frente”.

FLAGRANTE – ser apanhado assim pode ser a maior de todas as provas. Vem do Latim flagrans, “o que queima, ardente”, do verbo flagrare, “queimar”, da raiz Indo-Européia bhleg-, “queimar”.

Passou a ser usado a partir de 1706 com o sentido atual a partir da expressão jurídica in flagrante delicto, “com o crime ainda ardendo, ainda quente, recém-terminado”.

EXAME – para ser produzida prova, são necessárias muitas vezes procedimentos que chamamos de exame, como testar sangue, fibras presentes, armas disparadas, etc.

Essa palavra vem do Latim examen, “meio de testar”, de exigere, “pesar acuradamente”, literalmente “levar ou guiar para fora”, formado por ex-, “fora”, mais agere, “guiar, agir, levar”. O sentido figurado era “exigir, completar, inteirar”.

PESQUISA – compreende a reunião de informações e resultados de exames. Vem do Latim perquirere, “buscar com afinco”, de per-, intensificativo, mais quaerere, “indagar”, de quaestio, “busca, procura, problema”.

DETETIVE – geralmente imaginamos o agente da lei como um sujeito com capa de gabardine que anda atrás de provas.

A realidade é outra, mas podemos aproveitar para dizer que esta palavra vem do Latim detectare, “descobrir, destapar”, formado por de-, “fora”, mais tegere, “cobrir com algo”. Ele é a pessoa que “destapa, descobre” o que estava oculto pela conduta do criminoso.

A palavra em Inglês detective é um encurtamento da expressão detective police, “polícia investigativa”.

Falando nisso, convém esclarecer que Sherlock, palavra em uso desde 1903 e muitas vezes aplicada a um investigador como se fosse um sinônimo, é simplesmente um nome próprio inglês e quer dizer “de cabelo claro”. Vem do Inglês Arcaico scir, “claro”, mais locc, “mecha de cabelo”.

O autor das histórias em que Sherlock Holmes era um detetive de extraordinária eficiência, Sir Arthur Conan Doyle, colocou nele esse nome tal como poderia ter posto “John”, “James” ou “Archibald”.

INOCÊNCIA – é o que se presume se as provas não convencem a lei. Vem do Latim innocens, “que não causa dano ou mal”, formado por in-, negativo, mais nocens, “causador de dano”, do verbo nocere, “trazer dano”.

Em alguns países de língua espanhola, inocente se aplica como designativo às crianças pequenas.

CULPA – mas se a conclusão é outra… Esta palavra vem do Latim culpa, “crime, falta”.

Aproveitando, crime vem do Latim crimen, “lesão, acusação”, do verbo cernere, “peneirar, escolher”.

Provada a culpa, seguem-se as conseqüências.

SANÇÃO – não é aquele personagem da Biblia que derrubou o templo, não. Vem do Latim sanctio, “ato de de ordenar ou decretar”, do verbo sancire, “tornar sagrado, confirmar, decretar”, de sanctus, “sagrado”.

E este nome deriva de uma divindade romana, Sancus, em cujo nome eram feitos os juramentos.

PRISÃO – este lugar para onde quase nunca vão aqueles que nós sabemos que merecem tem o seu nome derivado do verbo latino prehendere, “prender, agarrar”. E ele se forma de prae-, “à frente”, mais hendere, derivado de hedera, “hera”, da noção de como essa planta se agarra aos muros para crescer. Talvez, algum dia, possamos ver lá todos os que deveriam estar presos.

Mas vai custar.

Resposta:

Culpa e Culpados

Há ocasiões em que uma pessoa ou um grupo delas se vê às voltas com acusações. Isso traz conseqüências duras, mesmo que não se prove nenhuma culpa. A contrapartida é que, por vezes, não há interesse em que seja feita a justiça, com o que os culpados de verdade saem ilesos.

Seja como fôr, os resultados abalam os relacionamentos dessas pessoas e, às vezes, atingem até um país inteiro. Hoje aproveitaremos para olhar as origens de algumas palavras relacionadas com esse assunto.

ACUSAR – do Latim accusare, “chamar uma pessoa para dar conta de suas ações”. O verbo se formava por ad-, “contra”, e causari, “apresentar como motivo”.

Passou pelo Francês acuser.

ARREPENDIMENTO –  do Latim re-, intensificativo, mais poenitere,“sentir contrição ou mágoa por uma má ação”.

Em Italiano existe uma palavra, pentimento, que passou a fazer parte de outros idiomas. Significa “anotações e alterações feitas por um autor do decurso do processo de criação de um texto”. Um manuscrito com pentimentos de um autor famoso tem extraordinário valor.

O surgimento dos editores de texto acabou com o mercado de pentimentos. A menos que o escritor seja tão vaidoso que salve as suas alterações.

PENITENTE – é uma parente da palavra anterior. Vem do Francês peine, do Latim poena, do Grego poiné, “punição, penalidade”. Penitente é “a pessoa que está pagando por uma infração”.

Penitenciária é o lugar onde as pessoas cumprem a punição por seus crimes. Nem todos os que merecem estão lá dentro.

Em diversas religiões existem penitentes que se flagelam em público para a expiação dos pecados.

Flagelar vem do Latim flagellus, diminutivo de flagrum, “chicote, látego”.

COMPUNÇÃO – cometer um mau ato e não sentir compunção é, literalmente, fazer isso sem que a consciência cutuque, sem que ela espete um dedo na pessoa para chamar a atenção sobre o que se está fazendo.

Há quem tenha consciências indulgentes assim; essas pessoas são um perigo para as outras.

Em Latim era compunctio, de com-, intensificativo, mais punctio, de pungere, “espetar, fincar”.

Como derivados deste verbo temos: pungente, “aquele que finca”; punção, “instrumento que faz furos”; puncionar, “fazer um furo para escoamento de um conteúdo”.

CONTRIÇÃO – do Latim Medieval contritus, particípio passado de conterere, “moer, esfregar”, formado de com-, intensificativo, mais terere, “atritar, esfregar”. Indica alguém que está arrepndido e se penitencia por maus atos.

A noção é a de que uma pessoa arrependida se sentiria como que moída, arrastada sobre pedras. Se isso acontecesse com todos, o mundo seria bem melhor.

REMORSO – é a mordida da consciência. Vem do Latim Medieval remorsus, “tormento”, do Latim remordere, “morder de volta”. Forma-se de re-, “outra vez”, mais mordere, “aplicar os dentes, morder”.

Existia a expressão remorsus conscientiae, “o tormento da consciência”.

A consciência indulgente de que falamos acima desconhece o remorso, não sofre com o sofrimento alheio e é por isso que os maus atos são praticados.

CONFISSÃO – do Latim confiteri, “conhecimento”, de com-, intensificativo, mais fateri, “admitir”. O particípio passado é confessus, “aquele que admite a culpa, confesso”.

Esse verbo confiteri não deu origem ao que hoje chamamos de confeito, não. Esta palavra, significando “um doce”, veio do Latim confectum, particípio passado de conficere, “preparar, fazer”. Esta palavra se forma de com-, “junto”, mais facere, “fazer”. Passou pelo Italiano confetto para designar um produto de pastelaria.

Nossos conhecidos confetes descendem também de confetto. Provavelmente por semelhança de forma e colorido, este nome foi aplicado às rodelinhas de papel usadas no Carnaval.

CONDENAR – passou pelo Francês Antigo damner, do Latim damnare, de damnum, “perda, estrago”. No Latim Eclesiástico, este dano era a perda da alma, a danação.

É por isso que, para os povos de língua inglesa, a palavra damn foi uma palavra a ser evitada por muito tempo. Eles até desenvolveram eufemismos para não pronunciarem a palavra em si, tais como dang e darn.

Estes seguiram a trilha de todos os eufemismos: acabaram virando em si palavras pouco recomendáveis em meios mais exigentes.

Curiosamente, no Português do Brasil, danado é uma palavra usada muitas vezes em termos elogiosos: “este site é danado de bom”!, por exemplo.

HUMILDADE – muitas vezes uma pessoa, para escapar a uma punição, adota uma conduta humilde. Com isso ela quer dizer que é simples e sem orgulho como a terra de que fomos feitos, já que a palavra vem do Latim humus, “terra”.

Convém lembrar que a palavra umidade não é escrita com “H”, erro bastante comum; nada tem a ver com humus. Ela vem do Latim umere, “molhar, encharcar”.

CONSCIÊNCIA – vem do Latim conscire, “estar mutuamente a par de”. Este verbo se forma por com-, “com”, e scire, “saber”, origem da palavra “ciência”.

“Saber algo consigo mesmo” implica em consciência, inclui uma prontidão mental, uma capacidade de distinguir entre o certo e o errado.

Uma consciência limpa ajuda a dormir bem. Dizem que dormir sobre pilhas de dinheiro mal havido é difícil. Mas há tanta gente fazendo isto que é difícil acreditar.

CULPA – do Latim “negligência, descuido, dano, crime”. A expressão mea culpa, “minha culpa”, foi agregada ao Latim Eclesiástico em 1374.

Desculpa é a tentativa de se livrar de uma culpa, seja comprovando que ela não existiu, seja reconhecendo que ela é verdadeira e retratando-se por isso.

VERGONHA – do Latim verecundia, “respeito, pudor, timidez”.

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