HORÓSCOPO I [Edição 75]

Uma tarde, quando eu estava lá com meus dez anos, entrei no gabinete do meu avô e disparei:

– Por que o senhor é asséptico, Vô?

Ele me olhou espantado:

– Como assim, meu rapaz? Já fui acusado de várias coisas em minha vida, mas disso
é a primeira vez!

– É que o outro dia a Tia Beth estava contando como o horóscopo é importante para se conhecer as pessoas e pediu para não contar para o senhor, por que o senhor é muito asséptico.

O gentil velho riu até as lágrimas correrem pela face e falou:

– Não é asséptico que ela quis dizer, seu cabeça oca, é cético. A primeira dessas palavras quer dizer “aquilo que evita micróbios”, do Grego a-, negativo, mais septikos,
“podre”, de sepein, “fazer apodrecer”.

cético vem do Latim scepticus, do Grego skeptikos, literalmente “aquele que reflete, que indaga”, de skeptesthai, “refletir, olhar, vistoriar”, do Indo-Europeu skep-, “observar”.

Sua tia é uma pessoa muito querida, mas acredita em cada coisa estranha…

Mas ela disse certo, eu me orgulho de ser cético; ou seja, de refletir, de observar, de
indagar e não acreditar em coisas importantes simplesmente porque a maioria acredita, sem provas.

– E de onde vem esse tal de horóscopo?

– Essa palavra vem do Grego  horoskopos, “nascimento, previsões para o futuro da pessoa”, formada por hora, “momento, dia, hora”, mais skopeo, “eu vejo”. A ideia é de que a Astrologia, estudando a configuração dos astros no céu quando a pessoa nasce, possa predizer suas características e acontecimentos importantes no futuro.

– E Astrologia, de onde vem?

– Ela vem do Grego astron, “estrela”, mais logos, “estudo, tratado”.

– Mas parece que o senhor não acredita muito nisso, né?

– Você é muito jovem mas já percebe quando algo não me entusiasma. Quem tem uma formação científica passa dificuldades para engolir as afirmações do pessoal da área.

– Por que, Vô?

– Porque eles se baseiam na Astrologia antiga. E ela não contemplava três dos planetas  que foram descobertos há menos de dois séculos e que são Plutão, Netuno e Urano.

Se eles exercem alguma influência à distância, como afirmam os horoscopistas, como é
que se viam sem eles para fazer previsões?

– Só por isso, Vô?

– Já não é pouco. Mas os horóscopos atuais se baseiam em constelações que estavam em certos pontos do céu há dois mil anos, e por causa de uma tal Precessão dos Equinócios, que não vou explicar ainda porque você é muito pequeno e porque estou com preguiça, não se encontram mais ali. O resultado é que quem acha que nasceu sob um signo há muito tempo pertence a outro. E isso muda todas as características esperadas para a pessoa.

– Tem mais?

– Sim. Eles não levam em conta a presença de massas como os asteróides, cometas e até a do obstetra que faz o parto, que tem um efeito gravitacional muito maior do que
o dos planetas, por estar mais perto do recém-nascido.

– Mas então por que acreditam nisso?

– Pode ter certeza de que eles dizem que esses argumentos todos não passam de tentativas para afastar as pessoas de Verdade e que modernamente não é mais assim e que isso é sabedoria dos Antigos e etc., etc. Enfim, há muita coisa envolvida, inclusive uma indústria que recebe dinheiro de quem acredita no assunto.

Mas antes que eu fique bravo com isso, vamos falar de coisas mais inofensivas, como as origens de palavras relacionadas com o assunto.

– Oba! Historinhas!

– É isso mesmo, e eu sei que você gosta de ouvir. Vamos ver: zodíaco, por exemplo, vem da expressão grega zodiakos kyklos, literalmente “círculo de pequenos animais, de
figurinhas”, formado por zoon, “animal”, mais kyklos, “círculo, roda”. Designa o conjunto de constelações que se encontra na trajetória do Sol ao longo dos céus.

– E constelação?

– Do Latim constellatio, “conjunto de estrelas”, de com-, “junto”, mais o particípio passado de stellare, “brilhar”, de stella, “estrela”.

– Tia Beth diz que o senhor é Touro, que por isso é teimoso…

– Ah, essas coisas são divertidas… O nome dessa constelação vem do Latim taurus, “touro”, que parece vir do Indo-Europeu steu-ro-, “ser forte, ser grande”, como convém a qualquer touro que se respeite.

Temos em Química a palavra taurina, que designa uma substância que foi encontrada pela primeira vez na bile de touro e portanto nada tem a ver com estrelas.

Diziam os gregos que Zeus, o Pai dos Deuses, uma vez se apaixonou por uma ninfa muito bonita chamada Europa, e que se transformou num belo touro branco muito mansinho que se aproximou dela.

– E ela?…

– Disse “Que bonitinho!”, subiu no seu pescoço e começou a enfeitá-lo com flores.

– E então?

– De repente ele se atirou no mar e nadou até a ilha de Creta,onde eles casaram e
tiveram filhos.

– E foram felizes para sempre?

– Não, porque com os deuses a coisa era muito complicada.

– Puxa, que história. Mas diga, eu sou de Áries, de onde vem isso?

– Ah, meu carneirinho, você tem muito tempo para dar suas cabeçadas neste mundo. Esse era o nome latino para “carneiro”, de uma raiz ligada ao significado de “saltar, pular”, coisa que os carneiros gostam de fazer. Em Latim, arietare significava “bater,
golpear com a cabeça”, mais uma atividade em que se destacam esses animais.

Na antiguidade se usavam os aríetes, troncos que muitas vezes ostentavam uma cabeça de carneiro de bronze na extremidade, para bater nas portas de muralhas e pô-las abaixo.

– E tem alguma lenda sobre ele?

– Claro que sim. Antigamente o pessoal, em vez de olhar TV, ficava nas cavernas gastando tempo livre em inventar histórias. Era bem mais produtivo que agora.

O carneiro dessa história seria um animal de pelo de ouro enviado pelo deus Hermes para proteger duas crianças que estavam sendo maltratadas na casa de seu pai, o rei da Tessália.

Mas por agora chega, que eu nunca fui tão velho na minha vida e agora canso de falar.
Se quiser, volte outro dia para a gente falar mais sobre o assunto.

– Sem falta, Vô!

E saí pensando em quantas histórias ainda ouviria de meu avô.

 

 

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