MORIGERADOS [Edição 112]

 

Hoje minha salinha de aula está dentro do seu how to write an outline for a book report assombroso normal: um grupo de crianças ferozes, incontroláveis, dando mostras da mais bárbara selvageria. Ah, vocês seriam o orgulho de Átila o Huno, se ele resolvesse abrir um colégio maternal em sua época.

Por que não tentam ser mais morigerados?

Hum, é isso; agora tenho o mote para dar uma aula de etimologia para vocês; paradoxalmente, é a única coisa que os acalma.

Ouçam: essa palavra meio estranha vem do Latim morigerari, “dar atenção, ter bons costumes”, de mores, “costume”, mais gerere, “conduzir-se, lidar com”. Se todos vocês fossem assim, esta professora talvez parasse de ter pesadelos todas as noites.

Seria bom também que fossem contidos em suas manifestações de ferocidade. Esta vem do Latim com-, “junto” mais tenere, “segurar, manter, obter”. O verbo continere queria dizer “segurar firme, conter, rodear”.

Às vezes me parece que só a farta distribuição de camisas-de-força nesta aula conseguiria mantê-los quietos.

Seria maravilhoso se o grupo fosse ajuizado. Esta vem do Latim judicium “ação de julgar, ofício de juiz”, de jus, “lei, regra, direito, adequado, perfeito”. Judicioso tem a mesma origem, não esqueçam.

Mas esperar isso de vocês é tentar tirar vinho de concreto armado.

Bem, então vocês poderiam ser assisados, quem sabe? Esta é bem pouco conhecida, mas é um sinônimo de ajuizado. Vem de siso, “juízo, bom senso, tino”, do Latim sensum, “percepção, sentimento, significado”, de sentire, “perceber, sentir, saber”.

Sisudo, que quer dizer “sério, prudente, sensato”, é outra derivada.

Sim, Zorzinho, o dente do siso tem a ver com o assunto. Trata-se de um molar que tem o mau hábito de nascer tardiamente, entre os 16 e os 25 anos. Como geralmente não há espaço para ele porque as arcadas dentárias a essa altura já estão ocupadas, seu surgimento muitas vezes acarreta dores, deslocamento de outras peças dentárias e até cistos e processos inflamatórios. Frequentemente ghostwriting hausarbeiten necessita de alguma intervenção.

Ele recebeu esse nome porque a idade em que se desenvolve é mais afastada da infância, um momento em que já se espera que o portador tenha maior capacidade comportamental.

Se bem que atualmente me parece que isso mudou muito.

Mas, voltando ao nosso assunto inicial, ser uma pessoa correta é sempre desejável. Ela vem do Latim correctus, de corrigere, “colocar em ordem, adequar, tornar certo”, formada por com, “junto”, mais regere, “guiar em frente, comandar”.

A Valzinha aqui levanta a mão… Sim, minha querida?

Hum, você quer saber se é correto uma das suas vizinhas de condomínio exigir que o marido cuide dos cinco filhos quando ela sai para a noite? Bem, isso não é assunto etimológico, de modo que vamos passar adiante e falar sobre a origem de ponderado. Esta deriva do Latim ponderare, “pesar”; por extensão, “avaliar, pensar sobre”, tal como uma pessoa avalia o peso de um objeto balançando-o na mão.

Uma coisa que vocês aqui decididamente não são é disciplinados. Esta veio do Latim disciplina, “instrução, conhecimento, matéria a ser ensinada”. E esta deriva de discipulus, “aluno, aquele que aprende”, do verbo discere, “aprender”. Mais tarde ela assumiu o significado de “manutenção da ordem, atendimento às regras”.

Ou seja, tecnicamente vocês aqui são meus discípulos, mas tenho sérias dúvidas de que consigam aprender alguma coisa.

Já que eu disse sérias, informo que esta vem do Latim serius, “importante, grave”, provavelmente de uma fonte Indo-Europeia swer-, “pesado”.

E agora vou citar uma que ninguém aqui deve ter ouvido: circunspecto. Deriva do Latim circumspicere, “olhar ao redor”, formada por circum-, “ao redor”, mais specere, “olhar”.   Uma pessoa assim encara de modo ponderado as situações e se porta de acordo.

Por exemplo, eu, ao cruzar pelo pátio da escolinha, olho sempre ao redor para evitar ser atingida por algum projétil que um aluninho meu resolva me atirar como demonstração de carinho.

Isso mostra que sou uma pessoa criteriosa. Esta vem do Grego kriterion, “padrão, regra para distinguir o verdadeiro do falso”, de krinein, “separar”. Se o grupo aqui tivesse a capacidade de separar suas tendências antissociais dos seus atos, o planeta inteiro se beneficiaria. Mas vá a gente repreender uma dessas figurinhas que os pais abrem um processo daqueles!

Ser equilibrado também é desejável. Ela vem do Latim aequilibrium,  formada de aequi, “igual” e librare, “oscilar”. Ao colocar pesos idênticos em cada prato da balança romana, ela não pendia mais para um lado que para outro: os pesos estavam equilibrados.

Ter um comportamento sóbrio é legal: esta veio do Latim sobrius, “não bêbado, composto”, de se-, de significado negativo, mais ebrius, “bêbado”, de origem desconhecida, possivelmente relacionada com o Indo-Europeu hegwh-, “beber”. Uma pessoa sóbria se comporta adequadamente, sem desviar-se das regras.

Aliás, adequado nos veio do Latim adequare, “tornar igual a”, de ad-, “a”, mais aequare, “igualar”, do aequi de que recém falamos. Tornar-se adaptado aos bons modos é muito bonito.

Enfim, gostaria que todos os presentes aderissem à sensatez, uma outra derivada de sensus.

Podem sair agora…

Não, não tentem passar todos ao mesmo tempo pela porta! Ai!

Céus, chamem o Exército, a Marinha! Que os santos me ajudem!

Bem, é o fim normal de mais um dia comum.

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