ALGUNS MONSTROS ANTIGOS [Edição 85]
Barbaridade, o comportamento monstruoso desta meninada de hoje. Nem vou reclamar muito, que hoje tomei uma dose reforçada de Nervocalm, agora com Vitamina C – é o que diz na caixa – e estou muito light.
Para demonstrar, hoje nós vamos falar na etimologia de alguns nomes de monstros. Olha aí, todos se assanharam.
Para começar, monstro vem do Latim monstrum, “ser deformado, monstruosidade, sinal, agouro”, literalmente “aquilo que deve ser mostrado”, derivado do verbo monere, “avisar, chamar a atenção para”.
Mas o assunto de nossa aulinha será a origem de nomes de monstros antigos, nada dessas coisas comuns de zumbis, vampiros e do Frankenstein que toma as telas de TV.
Aliás, este último nunca foi nome de monstro, sabiam? Ah, para isso eles têm cultura, né? Nome de escritor e cientista que é bom eles não sabem, mas agora várias mãos se levantaram para me contradizer.
Pois acontece que o monstro feito de retalhos e animado pela eletricidade dos raios que vocês conhecem simplesmente não tem nome; Frankenstein é o nome de seu criador, o cientista maluco aquele. O autor da história nunca lhe deu nome. Mas, no fim das contas, ele acabou sendo chamado pelo nome de seu, digamos, papai.
Hoje vamos começar por um ser que visitava as casas de nossos antepassados do Norte de Portugal, o Trasgo. Este era o equivalente aos gnomos e duendes de outras culturas. Seu nome era trasgu na mitologia asturiana.
Ele era baixinho, moreno, mancava da perna direita e tinha um furo na palma da mão esquerda. Vestia-se de vermelho e usava um gorro pontudo da mesma cor. Não era difícil reconhecê-lo, portanto.
Não façam essas caras de medo, ele não era dos piores. Ele era o responsável pelos barulhos que uma casa faz à noite e às vezes ficava travesso e quebrava alguma louça. De minha parte, acho que mais de um prato foi quebrado pelas crianças da casa e ele acabou levando a culpa.
No fundo ele era bonzinho, pois até fazia serviços domésticos quando se sentia bem tratado.
Melhor um desses do que uma abantesma perambulando pelos nossos corredores à noite. Esta palavra é uma variante de deriva do Grego phántasma, “espectro, ser imaginário”, derivado de phainein, “brilhar, iluminar”, derivado de phos, “luz”. Ou seja, trata-se apenas de uma imagem, algo incorpóreo como a luz.
A sereia era outro desses monstros. A expressão de vocês me mostra indignação; como assim, ela não é uma linda moça com rabo de peixe, amiga das pessoas?
De acordo com a mitologia grega, nada disso. Não era amiga dos seres humanos e, aliás, nem tinha esse aspecto. Elas eram grandes aves com cabeça de mulher. Gostavam de atrair os marinheiros com suas canções, para apanhá-los e os devorar depois.
E não eram muitas, não; apesar de os desenhos animados e filmes as mostrarem como uma espécie inteira, seu número variava originalmente entre duas e cinco apenas.
O que não deixava de ser bom para os marinheiros.
Antes que eu me esqueça, dizem que os nome delas vem do Grego seirein, “ligar, atar”, pois elas faziam isso com a atenção dos homens. Mas Tia Odete não vai colocar sua mãozinha no fogo com essa origem, já que palavras referentes a essa área são muito enganosas.
Estão todos quietinhos, de olho arregalado. Quando se fala em seres deste tipo vocês prestam atenção, não é? Já na hora de aprender qualquer outra coisa, é aquele trabalhão.
E agora me vem à cabeça a gárgula. Como todos sabem ou ainda virão a saber, é o nome dado àqueles enfeites que algumas igrejas da Europa têm do lado de fora, representando animais demoníacos com a boca aberta. São estruturas muito atraentes, através da qual a água da chuva é coletada e derramada para baixo. Elas são alongadas para o líquido escorrer para longe, de modo a não saturar o terreno junto às paredes do prédio.
Pois diz a lenda que elas foram feitas a partir da primeira, um monstro chamado em Francês Gargouille, que deriva do Latim gurguis, “garganta”, de origem onomatopaica, já que ele lembra o ruído de líquido sendo engolido.
Pois bem, a Gargouille era nada mais que um dragão típico, com asas e tudo, que andava infestando a região ao redor de Rouen e se divertia queimando tudo com o fogo que saía de sua boca.
Aí um religioso, que viria mais tarde a ser chamado São Romano, o enfrentou e o derrotou. Levou-o para cidade para queimá-lo, mas o seu pescoço e cabeça estavam tão habituados às chamas que não pegaram fogo.
O bravo santo, que devia ter seu lado de arquiteto, mandou colocar essa cabeça na parede da catedral, para comemorar a sua vitória contra o mal.
E mais tarde outros teriam tido a ideia de decorar as igrejas com estátuas semelhantes. Não venham me perguntar se é verdade, estou contando a história como eu ouvi.
Para terminar, vou contar que a esfinge que todos conhecem a partir da enorme estátua perto das Pirâmides do Egito também tinha um aspecto um pouco diferente na mitologia grega. Ela tinha corpo de leão, asas muito grandes e cabeça feminina.
Ela não era lá muito sociável, não; colocava-se no passo dos viajantes, na entrada da cidade de Tebas, e lhes propunha um enigma. Se eles não soubessem a resposta, ela os devorava.
Não sei não, mas ou o pessoal que passava por ela era muito esperto ou as perguntas dela eram muito tolas, porque não se soube de maiores problemas para entrar na cidade por causa disso.
Seja como for, seu nome vem do Grego sphinx, “aquele que estrangula”, do verbo sphingein, “apertar, atar”.
Bem, agora que deixei meus aluninhos com material bastante para ter bons sonhos esta noite, podem sair que a aula terminou.