Ao chegar perto do gabinete do meu avô, ouvi os acordes de uma sinfonia de Beethoven. Entrei sem dizer nada e me sentei no sofá de couro. Apenas sorrimos um para o outro e não dissemos nada. Ouvimos juntos a música até o fim.
Quando ela terminou, ficamos com aquele jeito meio de ressaca que Beethoven deixa depois que termina.
– Isso é que é som, hein, meu neto? Qual é o Rock que se compara, que traz emoções desse jeito?
– Tá bem, Vô, isso eu reconheço. O senhor ganhou desta vez. Mas, falando nisso, de onde vem essa palavra? Durante a música eu estava pensando nisso.
– Ora, ela vem do Latim sonus, “som”, de uma base Indo-Européia swen-, “soar, fazer ruído”. É interessante saber que a palavra inglesa swan, “cisne”, vem direto daí; a idéia é a de “ave que faz ruído”.
– Sonoro deve vir de sonus, aposto.
– Certo, mas essa é fácil demais. Pense em alguma outra.
– Vamos ver… supersônico, acertei?
– Sim, vem de super-, “acima, sobre”, mais “sônico”, “relativo ao som”. Essa palavra se começou a usar em 1939, como conseqüência do desenvolvimento dos motores a jato para aviões. Indica velocidades acima da velocidade de deslocamento do som. Mas essa também é muito óbvia, tente mais.
– Sonâmbulo, que tal?
– Estava bom demais para ser verdade. Tinha que fazer besteira. Essa palavra vem do Latim somnus, “sono”, mais ambulare, “andar, caminhar”. A imagem clássica do sonâmbulo é a do sujeito que anda enquanto dorme.
Mas nada tem a ver com som.
Nesse momento eu espirrei.
– Olhe só, você espirrou, puxou um lenço de papel e se assoou. Muito bem, conseguiu uma palavra derivada!
– É mesmo, Vô? Ora, eu sou inteligente até sem querer! E como é isso aí?
– Ela vem de ad-, “junto”, mais sonare, “soar junto, repetir um ruído”.
– Então, ressoar aposto que também!
– Isso mesmo, vem de re-, “de novo”, mais sonare. Quando a gente fala em determinados locais como uma igreja, nossas palavras ressoam porque o lugar é feito de modo a formar ecos que repetem e amplificam as palavras.
Aposto que você pouco usou até agora a palavra sonante.
– Verdade, Vô. Que é isso, algum instrumento musical da Idade Média, quando o senhor era menino?
– Não, eu nasci um pouco depois. Mas ainda na época em que rapazinhos desaforados levavam lambadas nas costas quando mereciam.
– Ainda bem que eu nasci numa época de correção política em que não se pode fazer essas coisas, né, Vô?
– Humpf. Voltando ao que interessa, sonante se usa para fazer referência ao pagamento feito em dinheiro, não com cheque ou transferência eletrônica.
– E dinheiro faz barulho?
– Fazia, fazia. O termo é de 1635, da época em que eram usadas moedas que tilintavam quando eram largadas sobre a mesa para pagar alguma coisa.
E agora me lembro, já que esta conversa começou por causa de uma música, que há um tipo de composição clássica, a sonata, que vem do Italiano sonata, “composição para poucos instrumentos, não cantada”.
Bem, agora chega. Vá para casa estudar, antes que soe a hora fatídica de prestar seus exames.