Palavra pistola

MOEDAS II

  (CONTINUAÇÃO)   DÓLAR  –  do Baixo Alemão daler, de thaler, uma abreviação de Joachimsthaler, “do vale de Joachim (thal sendo ‘vale’)”, localizado no que era então o noroeste da Boêmia, hoje parte de República Tcheca.

Nessa região havia minas de prata, a qual passou a ser cunhada em moedas a partir de 1520. Devido à origem do metal, as moedas começaram a ser conhecidas como joachimsthaler. Daí se originaram vários nomes de moedas, como o tallér húngaro, o tólar tcheco, o norueguês rigsdaler e, através do Holandês, o dollar do Inglês.

Há uma palavra que todos conhecemos que é uma parente inesperada dessa moeda. Trata-se do nome dado ao hominídeo conhecido como Homem de Neanderthal, e a história é meio complicada e cheia de coincidências.

No século XVII havia na Alemanha um ministro protestante e compositor de hinos religiosos chamado Joachim Neumann, que fazia muitos passeios inspiradores por determinado vale próximo à cidade de Düsseldorf. Seu sobrenome quer dizer “novo homem”, em Alemão. Ele gostava de ser chamado de Neander, que quer dizer precisamente isso em Grego (de neo, “novo”, mais anér, “homem”).

O bom povo da região passou a chamar a região de Neanderthal, “o vale de Neander”, em homenagem ao religioso, ao redor de 1850. Foi ali que se descobriram os restos da espécie agora extinta e muito próxima ao Homo sapiens atual, com uma diferença genômica de apenas 0,12%.

E aqui estão as coincidências: o fato de, num lugar chamado de “novo homem”, ter sido descoberto o que, na época, era mesmo um homem novo dentro da classificação geral. E o fato de haver um nome Joachim e um vale envolvidos no nome tanto do hominídeo como da moeda que ora estudamos.

TOSTÃO  –  vem do Francês teston, do Italiano testone, “cabeça grande”, aumentativo de testa, “cabeça”. Isso porque essa moeda do século XIII apresentava inicialmente uma cabeça do governante do momento bem visível. Ela chegou a ser de ouro ou de prata, mas com o tempo acabou perdendo significado e sendo sinônimo de “dinheiro de pouco valor”.

VINTÉM  –  era antes uma moeda equivalente a vinte réis, daí o seu nome.

DOBRÃO  –  do Espanhol doblón, de doblo, “duas vezes”, provavelmente porque valia duas moedas de dez maravedis.

CRUZEIRO  –  essa passou a ser a moeda corrente no Brasil por vários anos a partir de 1942. Seu nome foi escolhido a partir da constelação do Cruzeiro do Sul, um símbolo característico de alguns países de nosso hemisfério e que não pode ser avistado no hemisfério Norte. Não precisamos dizer que cruzeiro vem de cruz, do Latim crux.

CRUZADO  –  foi usado no Brasil entre 1986 e 1989 e sua origem é a mesma que a do cruzeiro.

DUCADO  –  foi o nome de moedas de diversas regiões da Europa, por serem emitidas pela autoridade mais alta de uma divisão político-geográfica conhecida por “ducado”, já que estava sob o comando de um duque. E esta palavra vem do Latim dux, “o que guia, líder”, que veio do Indo-Europeu deuk-, “guiar”.

PISTOLA  –  o que é que o nome de uma arma de fogo está fazendo no meio destas moedas? Tem seus direitos: pistola foi o nome de várias moedas de prata européias. Veio do Latim plastrum, “achatado, encurtado”, o que descreve aceitavelmente uma peça metálica em forma de disco, como é o caso de uma moeda.

ZLOTY  –  é a moeda atual da Polônia e quer dizer “feito de ouro”, o que foi o caso inicial. Por bastante tempo essa palavra foi usada para designar qualquer moeda de ouro que se usasse no país.

FLORIM  –  foi moeda na Inglaterra, Itália, Áustria e ainda é usada em Aruba. Seu nome vem da moeda cunhada em Florença, que era muito bem reputada. O símbolo desta cidade era estampado num dos lados; era uma flor-de-lis, de onde a denominação.

Resposta:

Armas Modernas

Encontrei meu avô no pátio, olhando as flores com uma lupa, seguido do gato Ernesto, muito curioso.

– Procurando bactérias, Vô? – perguntei, com cara muito inocente.

Ele chegou perto de mim em silêncio, muito sério, fingiu examinar-me com a lente de alto abaixo e falou, como para consigo mesmo:

– Extraordinário! Sem dúvida, isto é a maior bactéria do mundo. Gigantesca, bastante bem estruturada, mas com a inteligência que era de se esperar para um ser primitivo desses.

– Mentira, vô! – eu gritei, em tom de queixa.

Ele me olhou com ar de surpresa:

– E fala! Com esta descoberta, se eu não ganhar o prêmio Nobel…

– Não sou bactéria gigante nenhuma, sou o seu descendente! – ele fez um ar muito surpreendido:

– É mesmo! Agora reconheço a sua voz. Mas devo dizer que você lembra muito um Enterococcus crescido.

– Pare de mangar comigo, Vô. Vim aqui para consultar sobre um assunto – ele se sentou na cadeira preguiçosa e fez o seu olhar de “Fale, então”.

– Esses tempos o senhor falou na origem dos nomes de armas antigas para mim. Eu prometi para uns colegas levar as origens dos nomes de umas modernas, pode ser?

– Claro, as de matar gente individualmente não servem para eles. Tem que ser as que fazem o serviço por atacado, não? Mas podemos dar uma olhada nisso, para horror dos pacifistas.

Podemos começar com o material do pessoal do Velho Oeste, o revólver. Essa palavra veio do Latim revolvere, “virar, girar”, formado por re-, intensificativo, mais volvere, “fazer girar, dar voltas”. Esse nome foi dado porque o seu tambor gira para apresentar uma nova bala ao cano.

– E a pistola, Vô?

– Essa vem do Tcheco pis‘tala, “arma de fogo”, literalmente “cano”. Mas há quem diga que vem do Italiano pistolese, “de Pistóia”, que era um centro de fabricação de armas importante. Quando começam a abundar as possibilidades etimológicas, não dá para assinar embaixo de nenhuma.

Em matéria de armas pessoais, vem logo à mente o fuzil. A palavra deriva do Latim vulgar focilis, da expressão petra focilis, “pedra de fogo, pederneira”, sendo focilis gerado de focus, “fogo”. Isso tem relação com o uso da pederneira para gerar o fogo necessário para incendiar a pólvora e assim iniciar o processo de tiro nas armas antigas.

– E de onde vem escopeta?

– Não vem. Pelo menos em nosso país, essa palavra não tem aplicação correta. É coisa de jornal, aplicar essa palavra espanhola para aquilo que já tem o nome de espingarda por aqui.

Mas essa palavra vem do Italiano schioppetto, “arma de fogo longa”, que vem de schioppo, “explosão”.

O correto, ao se falar de uma arma longa, de cano com interior liso, é usar espingarda, que veio do nome francês de uma arma completamente diferente, a espringale.

Esta era uma espécie de catapulta para lançar projéteis grandes, cujo nome vem do Frâncico springan, “saltar”. Passou ao Italiano como spingarda e daí veio ao Português.

Falando em bobagens de jornal, muitas vezes a gente lê sobre “espingarda de cano cerrado”. Seria bastante perigoso usar uma arma dessas com o cano cerrado, pois ele explodiria no primeiro tiro. No caso, o que se quer dizer é serrado, “cortado”.

– Pois é, a gente vê no cinema essas armas com o cano encurtado e até pensa que é bobagem todo aquele cano e aquele peso, se os mocinhos usam umas com o cano bem curto e a coronha cortada, para ocupar menos lugar.

– Bobagem são essas histórias de cinema. Experimente pegar uma arma assim e dar um tiro. O recuo dela não permitirá acertar em nada e provavelmente vai derrubar você. Aquela massa toda é necessária para ajudar a absorver o choque.

– Ahnn… E agora fale-me sobre o rifle, Vô.

– Pois o rifle é uma palavra que não condiz com nada definido em nosso idioma. Rifle, em Inglês, designa apenas uma arma de fogo longa com raias no interior do cano para imprimir maior precisão ao tiro. Vem do Francês rifler, “arranhar, sulcar, escavar”.

Essa palavra poderia designar um fuzil, uma carabina, uma metralhadora – ou seja, armas tão diferentes que é melhor não usá-la.

– Puxa, e a gente sempre ouve falar nisso na TV… E a carabina?

– Essa tem uma história que dá muitas voltas. Vem do Francês carabin, que era como se chamavam os soldados da cavalaria ligeira. Os soldados a cavalo sempre tiveram que usar armas de fogo mais curtas, devido à dificuldade de manejo sobre a sela. O nome dos soldados passou às armas que eles portavam.

Esses soldados tinham recebido, por tradição, o nome que era usado pelos arqueiros de Flandres, escarrabin, “escaravelho”, que era como se chamavam os besouros necrófagos, ou que se alimentam de corpos em decomposição.

Esse nome era aplicado aos que carregavam corpos dos mortos pela peste e passou aos tais arqueiros porque se dizia que eles matavam tanto como a peste.

Assim, carabina e escaravelho têm a mesma origem, veja você.

– Mas que estranho!

– É verdade. E, falando em bichos e armas, me vêm à mente os dragões.

– O senhor acredita neles, Vô?

– Nunca vi um, mas isso não prova nada. No entanto, eu me refiro aos soldados de cavalaria ligeira que recebem esse nome, e que muitas vezes usam bonitos capacetes com um dragão em cima.

Eles foram assim chamados, lá por mil seiscentos e tantos, por causa da arma mais curta que usavam, e que por isso expelia grande quantidade de chamas ao disparar, tal como é hábito os dragões de verdade fazerem.

– E o que me diz o senhor da metralhadora que a gente vê ser puxada debaixo da capa e fazer aquele estrago? Essa é que legal, não sei por que os soldados não usam só essa arma. É difícil errar, com aquele jato de balas…

– Claro, espertinho, só que o tal “jato de balas” não dura mais que uns dois segundos até se esgotar o carregador.

– História, Vô, eles passam um tempão atirando nos filmes!

– Ah, geração que acredita nos filmes! Aquilo é mais uma mentira, rapaz. Sem falar que, a cada tiro, a arma se desvia mais para fora da mira. A precisão dessa arma em rajada é, no mínimo, duvidosa.

Mas você está se referindo ao que se chama de submetralhadora, aquela que pode ser levada por uma pessoa e disparada sozinha. Ela usa munição de pistola, de menos alcance e poder do que as de verdade, que disparam de um equipamento de fixação e têm outra munição.

O nome dela vem do Francês mitrailleuse, “metralhadora”, que vem de mitraille, “pedaços de metal”, derivado do nome de uma moeda de pequeno valor, mite, do Germânico mit, “cortar em pedaços”.

Muito antes de ser inventada essa arma de disparo automático, os canhões eram carregados com metralha, isto é, pedaços de metal diversos, que se espalhavam e obtinham um efeito terrível contra pessoal. Esse nome se aplicou à nova arma, que também atirava diversos projéteis, só que não todos de uma vez.

– Bom, Vô, vou levar isso para os meus colegas e me exibir bastante.

– Certo, meu Enterococcus, e aproveite para dizer a eles que jamais se aponta uma arma, carregada ou não, para ninguém.

Resposta:

Origem Da Palavra