Um padre preocupado
Bom dia!
Lembro dos meus tempos do ensino fundamental, onde os mestres nos levavam aos passeios turísticos mais interessantes – e infelizmente pouco conhecidos – da cidade. Num deles, na paróquia local, um padre muito conceituado (exímio historiador da cidade) expôs as mais variadas obras em latim constantes no seu acervo histórico. Ele bem que tentou falar para aquelas crianças algo de latim, porém, após algumas tentativas e numa expressão muito triste, sentiu pelo abandono do ensino do latim nas escolas. Nós, como crianças, ficamos muito curiosas. Certamente não nos oporíamos ao ensino dessa língua atualmente tão misteriosa.
Minha pergunta, que creio ser acessível para os mestres, está muito distante da claridade do ensino que eu tive. Qual o motivo do português, sendo uma língua latina, não ter herdado o sistema de declinações do latim? Por que abandonamos o ensino dele, se é por ali que se constrói grande parte da etimologia?
P. S.: Creio que o papel dos gramáticos – e aqui enfatizo o da ABL – está mais longe dos falantes da língua do que o próprio latim dos padres. Justifico: grande parte do povo brasileiro sequer sabe da existência da Academia, que além de não nos ajudar com a fluidez do idioma, não fundamenta nossos alicerces linguísticos e tampouco mantém uma comunicação clara. Na minha concepção, pode-se deitar ao túmulo a ABL. Já me deram desgosto demais com uma reforma tola em que, por muitos anos, valeram duas alternativas – e nós aprendemos um bananal de regras que caíram. Benéfico ou não, fato é que a ciência exata não renegou suas origens, tendo adotado o latim nos nomes científicos. No português brasileiro, no entanto, o que se vê é a negação da história (lembranças aos pioneiros jesuítas) em detrimento de um ufanismo que nunca fez parte da nossa brasilidade, tão marcada por exploração, quando nos são negados os direitos mais essenciais desde a colônia; censura, quando o Estado Novo proibiu a fala aos imigrantes e ignorância, quando na escola nos expõem um amontoado de regras gramaticais que constrói pouco, afinal sequer existe aqui uma interpretação de texto coerente.
Até mais e obrigado, caros ilustres!
Resposta:
Belas observações. Concordamos com elas.
O Português e outros idiomas romances praticamente abandonaram o sistema de declinações porque os casos destas eram demonstrados pela variação da sílaba final. E a humanidade tem uma tendência danada de engolir o final das palavras. Com isso, a função delas na frase ficava difícil de reconhecer. De tal modo, os idiomas acabaram se tornando analíticos, isto é, passaram a ter as funções designadas por palavras auxiliares, como “de”, “para”, “em”, etc.
Mas não chore muito pela perda, que ela não foi total. Pense que indicar o gênero ou o número de uma palavra são mostras vivas diárias do uso de declinações.