CORES DIFERENTES [Edição 89]
Mais uma noite de trabalho para o celebérrimo Detetive das Palavras X-8 em seu apartamento-escritório de aspecto cuidadosamente decrépito, preparado para dar um clima de emoção e mistério. Ele é um mestre do marketing e sabe que as palavras que o consultam para descobrir as suas (delas) origens pagam mais por uma ambientação romântica.
Sentadas à frente dele se encontram as palavras de mais um Encontro Temático, uma novidade que ele inventou para ganhar mais dinheiro.
É assim: ele anuncia que em tal noite vai fazer um desses Encontros, com desconto conforme o tamanho do grupo.
O tema de hoje é Cores Diferentes. Os bancos ocupados atestam que várias palavras se interessaram.
Vamos ver o que diz o nobre profissional, depois de feita a introdução de praxe, que não passa de um seco “Boa-noite”:
– Vamos escolher ao acaso uma das gentis clientes… Vejam ali nossa conhecida Cor-de-Maravilha. Você é uma cor misteriosa, de definição esquiva.
A cor se ruborizou, mas não deu para notar por causa do seu tom avermelhado.
– Há quem a defina como um carmim avermelhado ou purpúreo. Você, combinada com ciano, amarelo e preto permite, em termos de impressão gráfica, preparar qualquer outra cor.
Seu nome era outro inicialmente. Mas se decidiu fazer a escolha dele em 1859, devido à Batalha de Magenta.
Esta se deu entre tropas franco-sardas e austríacas, com a vitória das primeiras e se desenrolou nos campos próximos à pequena cidade de Magenta, no que hoje é o norte da Itália.
Houve áreas em que a batalha foi muito renhida e esses apresentavam, depois de tudo terminado, uma coloração avermelhada do sangue derramado que levou a dar o nome do lugar a uma determinada cor. Pelo menos é o que dizem.
Esta cor também pode ser dita carmim, do Árabe kermes, um pequeno inseto que teve o azar de produzir um bom corante.
Ela tem uma parente, sentadinha ali do seu lado. Parente em termos da descrição da cor em si, não de origem. Se bem que, em termos de história, há certa coincidência de circunstâncias. Estou falando de solferino, uma espécie de cor-de-rosa puxando para o púrpura.
Curiosamente, ela também deve seu nome a uma batalha ocorrida na mesma guerra da de Magenta. Aliás, na mesma região e com diferença de alguns dias apenas.
O nome da cidade e da batalha foi aplicado, pelo destaque do encontro, a uma cor que havia sido sintetizada na época.
Aqui no Brasil alguém resolveu lhe dar o nome de cor-de-maravilha, palavra que veio do Latim mirabilis, “extraordinário, excelente”, de mirus, “assombroso, surpreendente”.
Vejo que outras clientes estão assanhadas. E com razão, pois estão envolvidas neste caso, de uma forma ou outra.
Vamos falar de fúcsia, que ao que parece já sabe que por um tempo foi usada para denominar o que hoje é magenta, não?
A palavra assentiu.
– Você agora se usa para um cor-de-rosa forte, aproximando-se do magenta. Seu nome vem da planta do gênero Fuchsia, cujas flores têm essa cor. Todo o mundo aqui decerto conhece o brinco-de-princesa. E ele veio do botânico que fez a descrição inicial da planta, um sueco chamado Leonard Fuchs.
Ali vemos ciano agitando as mãos, querendo ser a próxima. Vamos lá: você deriva do Grego kyanos, “azul-escuro”. Mas atenção: atualmente designa um azul-esverdeado, também conhecido nos meios técnicos como aqua. É a cor da água limpa sobre um fundo de areia, como nas praias do Caribe.
E você tem um uso que poucos sabem: por ser considerada uma cor repousante, as paredes e as vestes de quem trabalha numa sala cirúrgica são em tecido dessa cor.
E como é na verdade a cor complementar do vermelho, a cor do sangue se apresenta menos viva nesses tecidos, o que pode ser útil caso o paciente acorde cedo demais da anestesia.
A seguir, veremos algo sobre bordô. Você é um vermelho-escuro associado com a cor do vinhos da região de Borgonha, na França. E ela se chama assim porque o nome que os romanos lhe deram era Burgúndia, “país dos Burgundos”, uma tribo germânica estabelecida no local.
Vinda de bandas bem distantes, aponto para o auditório a presença de cáqui. Ela vem do Urdu khaki, “empoeirado”, do Persa khak, “poeira, terra”. A cor foi introduzida no exército inglês da Índia em 1847 e passou a ter amplo uso entre militares por ajudar os soldados a se ressaltarem menos contra o fundo.
Desde já avisamos que essa palavra nada tem a ver com o nome da fruta caqui, que vem do Japonês kaki e tem outro acento.
Vamos agora falar em púrpura, que citamos em relação com outras cores. Sua origem é o Latim purpura, molusco do qual se extraía esse corante vermelho puxando para o roxo, chamado em Grego porphyros.
Esse pigmento era tão caro que se reservava inicialmente apenas às vestes imperiais e depois a algumas eclesiásticas. Mas havia outro preço a pagar pela distinção de usar tecidos dessa cor: eles cheiravam muito mal, devido aos materiais usados no processo de fabricação.
Podem ter certeza: uma pessoa de nossa época não conseguiria chegar perto para abraçar um dos Césares vestido a rigor.
E olhem só ciclame. Seu nome, cara cliente, vem do Grego kyklaminos, relacionado provavelmente a kyklos, “redondo, circular”, dado o formato do bulbo da planta que ostenta flores desas cor rósea meio arroxeada.
Uma curiosidade: todas vocês podem desistir de serem identificadas por homens. O fato é que os homens têm uma capacidade muito menor do que as mulheres para distinguir cores, enquanto eles são dotados de muito mais acuidade para separar tonalidades.
Portanto, só as mulheres são capazes de distinguir ciclame, abóbora, damasco, burro-quando-foge e outras cores que se usam nos seus esmaltes e maquiagens diversas.
Bem, por hoje é só. Favor não aplaudirem, que tenho vizinhos que deitam cedo. Até uma próxima vez.