Palavra cauda

FELINOS

 

Hum, por que meus aluninhos de Maternal estão juntinhos, quietos, olhando para alguma coisa sem baterem uns nos outros? Boa coisa não pode ser, portanto parem já com isso!

Ah, vejam só, estão olhando fotos dos gatinhos de alguns de vocês? Deixem-me ver. Olhem só, que bonitinhos! Fofinhos, doces olhares… quem me dera poder dizer o mesmo de certos alunos meus.

Enfim, percebo que nossa aula de hoje será sobre gatos. Este nome vem do Latim cattus, “gato”, que começou a ser usado lá pelo século quarto de nossa era, com a introdução do gato doméstico em Roma. Antes disso, a origem da palavra é desconhecida.

Ela substituiu outra, feles, palavra usada para denominar “gato, gato selvagem, marta”. Eles não estavam muito criativos naquela época, acho que andavam com preguiça de criar nomes diversos para animais distintos. Mas feles se manteve na linguagem culta, de onde nossa palavra felino.

Estão vendo os bigodes que todos ele têm? Não são apenas enfeites, são órgãos muito importantes. Eles não focalizam muito bem os olhos até uns trinta centímetros, de modo que eles usam, para distinguir o mundo próximo, esses pelos. Eles se implantam mais profundamente que os outros na sua pele e em sua base têm terminais nervosos. Assim eles obtêm informações do ambiente próximo. Esses pelos se chamam vibrissas, do Latim vibrare, “vibrar, sacudir-se”.

Observem que eles têm vibrissas também sobre os olhos e na base das patas. Jamais se deve cortar as vibrissas de um desses bichinhos.

O que me traz à mente a palavra bichano, muito usada para eles. Ela vem de bicho, que vem do Latim bestia, “qualquer tipo de animal”.

Não sei se já notaram, mas às vezes, quando eles cheiram algo, ficam com a boca entreaberta por um tempinho. Isso quer dizer que eles estão usando o seu Órgão de Jacobson, um conjunto de células no céu da boca que faz análises químicas a grande velocidade e envia informações úteis ao cérebro de nosso amigo.

Esse órgão também é dito vomeronasal, do Latim vomer, osso achatado na base do nariz, originalmente “relha de arado”, mais nasalis, “relativo ao nariz”, nasus.

Alguns gatos têm a cauda especialmente peluda e bonita, olhem só. Esta palavra vem do Latim cauda. Não mudou em milhares de anos, observem.

Outro nome para este grande auxiliar do equilíbrio dos gatos é rabo, do Latim rapum, “cauda, rabo”.

Vamos falar no ronronar dos gatos, mesmo que ele não apareça nas fotografias. É esse sonzinho maravilhoso que eles fazem quando estão contentes e é claro que ele tem origem imitativa: rom-rom-rom…

Outra palavra que tem essa origem é o miado, que representa a voz deles.

Falando na voz, há uma característica especial nas manifestações sonoras deles. Descobriu-se que eles só falam entre si, ou seja, miam, em situações de filhotes chamando a mãe e vice-versa; quando estão brigando, ocasião em que xingam os antepassados um do outro com os palavões mais terríveis; e quando estão fazendo declarações de amor, as quais, aliás, têm grande semelhança com os sons de briga.

Fora isso, eles transmitem sentimentos e informações entre si apenas com a linguagem corporal: mudam a posição das orelhas e da cauda, alteram o diâmetro das pupilas, apresentam-se de lado e com o pelo eriçado para ficarem mais ameaçadores… Uns verdadeiros artistas.

No entanto, eles falam com os humanos. Desenvolveram uma comunicação vocal somente para nós e quem domina o idioma deles –  Tia Odete aqui se orgulha disso  –  entende muito do que eles nos passam. Já tive conversações muito interessantes com felinos, mas não contem isso aos seus pais.

Eles enxergam muito bem no escuro, já que se desenvolveram a partir de predadores noturnos. Aliás, há um estudo que diz que ele são o predador mamífero de maior sucesso atualmente, pois chegam a usar mais de mil espécies de outros animais como caça.

E predador vem do Latim praedator, “aquele que rouba, que saqueia”, de praedare, “saquear, roubar”, de praeda, “botim, material roubado”.

Muito lindos, os seus animaizinhos. Agora vão para casa e cuidem bem deles, que eles merecem.

Resposta:

Avião

– Diabinhos, parem de incomodar a Patty! Val, Bebel, Lúcia, Joãozinho, vão ali para trás e olhem o exemplo dos que não incomodam.

Olhem a Maria Tereza sentadinha de vestidinho branco imaculado, os pezinhos cruzadinhos debaixo da cadeira. Olhem o Zorzinho escrevendo sem parar, mesmo sem saber direito ainda. Olhem o Soneca roncando na sua cadeira. Por que vocês não podem ser assim?

Fiquem quietos! Pare de chorar e conte-me o que houve, Patty. Ah, você disse que queria ser aeromosca quando crescer e eles começaram a zoar?

Em termos de Português você merecia mesmo uma reprimenda, mas não era para tanto.

Vamos nos sentar que eu vou contar para vocês algumas coisas sobre aviões. Opa, foi só falar nisso que o Soneca acordou.

Avião é uma palavra que foi feita bem antes de existir o próprio, e é derivada do Latim avis, “ave”. Foi um francês, Landelle, que a usou primeiro num tratado chamado Aviation ou Navigation Aérienne, “Aviação ou Navegação Aérea”. O nome avion foi dado por Clément Ader a um aparelho que ele esperava que voasse em 1875 e pegou entre os idiomas latinos. Os Germânicos chamam seus aparelhos com nomes de outra origem.

Devo dizer, Patty, que as moças que têm tanto trabalho com os passageiros dentro desses aparelhos se chamam aeromoças, não aeromoscas. Nem vou dizer a derivação, que foi feita dentro do Português mesmo.

Não, Arturzinho, não dá para se saber como se dizia aeromoça em Latim porque em Roma não havia aviões.

Ai, Senhor, quando será que vão arranjar um bom professor de História Clássica no Maternal para este colégio?

Hoje este pessoal é chamado de comissário. Essa palavrinha vem do Latim commissarius, a pessoa que organizava os jogos circenses. Formava-se por com-, “com”, mais o verbo mittere, “lançar, emitir”.

Guiando o avião está um outro moço, o piloto, que comanda o leme para que a gente siga pelos caminhos do céu no meio das nuvens. Essa palavra veio do Grego pedon, “timão, leme”. Gostou, hein, Soneca?

O co-piloto não precisamos explicar de onde veio, né? Podemos dizer que ele usa um uniforme bonito como o resto do pessoal de bordo.

E essa palavra, de onde veio? Ah, do Latim uniformis, “o que tem um só aspecto, uma só forma”. Foi no Francês uniforme, de 1748, que essa palavra passou a significar “roupas usadas por um grupo para se distinguir dos demais”.

O avião tem uma fuselagem onde todos devem ficar sentados quietinhos bem bonitinhos até chegarem ao destino. Este nome vem do Francês de 1908 fuselage, “corpo do avião”, que vem do Latim infundibulus, “funil”, por certa semelhança de forma. E a palavra latina veio do verbo fundere, “derreter, espalhar, fundir”. Muitas vezes o material derretido para algum propósito era passado por um funil.

Tem também as asas, que derivam do Latim ansa, “cabo, punho, asa de vaso”. Por incrível que pareça, não vem de ala, “asa de ave”.

Geralmente nas asas há umas coisas penduradas e barulhentas que são os motores, que vêm do Latim movere, “deslocar, mover, fazer mexer”. Aplica-se a “máquina que dá a capacidade de mover algo” desde 1856.

Eles podem ser a jato, do Inglês jet, “jato”, do Latim jectare, “lançar, atirar”. Isso porque eles imprimem movimento ao avião lançando uma torrente de ar para trás.

Se os motores não forem a jato, eles têm uma hélice, que vem do Grego helix, “espiral, movimento circular”, do verbo eilein, ” torcer, girar” do Indo-Europeu wel-, “girar”.

Como? Não, não sou do tempo dos dirigíveis nem vi Santos Dumont fazer o primeiro vôo, engraçadinhos. Nasci bem mais tarde, para o seu governo.

Se pararem de me interromper, vou poder contar que, lá no fim da fuselagem, há uma estrutura chamada cauda, indispensável para a estabilidade e controle do avião. O nome vem de uma analogia evidente com a cauda dos animais, que era cauda mesmo em Latim e se situa lá no fim do bicho.

Para que ele possa andar pela terra quando não está voando, ele tem um trem de pouso.

Eu sei, eu sei que as rodas são de borracha, não são de trem. Esta palavra vem do Inglês train, do Latim traginare, uma forma do verbo trahere, “puxar, arrastar”.

Isso deu origem a palavras que expressam “objetos unidos uns atrás dos outros” e também “conjunto de coisas com uma finalidade comum”, que é o caso aqui.

Não, Lúcia, se o avião cai o pessoal de bordo não se atira de pára-quedas deixando os passageiros na mão lá dentro.

Eles cumprem com o seu dever de auxiliar as pessoas sob sua responsabilidade até o fim. Aliás, o nome desse artefato vem de parachute, uma palavra que um tal Blanchard, que andava fazendo experiências com balões, inventou em 1785.

O para- quer dizer “proteger contra” e vem do Latim parare, “preparar”; o chute vem do Francês antigo cheoir, “cair”, do Latim cadere, “cair”.

Os aviões descem nos aeroportos. Essa palavra se formou por analogia com os portos, onde também chegam e saem veículos com cargas, só que aqui os veículos andam pelo ar, aer em Latim e Grego.

Esses locais são também chamados aeródromos, palavra feita do Grego aer mais dromos, “correr, deslocar”, pois é isso que os veículos aéreos fazem ali.

Sim, Sheilinha, aeródromo tem a ver com dromedário, muito bem. O nome deste bicho em Grego era dromas kámelos, “camelo de corrida”.

Lá vem a Valzinha contar uma de suas histórias… E aí a bagagem da sua tia foi trocada no hotel pela de um senhor e ela só percebeu a troca ao abrir porque as malas eram iguais, mas havia muitas roupas íntimas femininas? E por que não? Decerto ele era representante, vendedor ou algo assim…

Ah todas de tamanho grande como ele? E da mesma cor? Sapatos de salto agulha 42? Chicotes e algemas também? Talvez ele fosse representante de artigos para carrascos, as roupas fossem para uma amiga de pé grande e vamos voltar ao assunto da aula e por favor fique quietinha aí.

Essas trocas de bagagem ocorrem às vezes. Não, comigo nunca aconteceram; andei pouco de avião. Por que andei pouco de avião?

Porque não ouvi o que o meu pai disse quando me recomendou casar com um sujeito bem de grana para depois me divorciar e ficar só gastando o dinheiro dele.

Mas não, ah, não! A esperta aqui resolveu que tinha um ideal, que era o de ensinar as crianças, o futuro de nossa nação, etc., e vejam só onde fui parar!

Mas deixemos de chorar pelo lacticínio derramado e falemos da origem de bagagem. Ela vem do Inglês baggage, que veio do Francês bagage, onde bague era “pacote, saco”.

Se depender de mim, vocês vão sair das minhas aulinhas com uma bagagem cultural nada desprezível. Se depender unicamente de vocês, sairão só com letras de pagode nas cabeças ocas.

Quando o avião parte, diz-se que ele decolou. Essa palavra vem do Francês décoller; foi criada lá por 1835 e… Parem com a gritaria! Eu sei muito bem que não havia aviões nessa época! Hein? Não, Deli, nem mesmo aviões gigantes de pergaminho!

Deixem-me falar: ela queria dizer, originalmente, “descolar, separar objetos grudados, afastar”. Em 1907, foi aplicada ao ato do avião se afastar da terra, como se estivesse antes colado nela e se soltasse. Viram, seus impacientes?

Tudo o que sobe deve descer; quando tudo corre bem, o avião aterrissa; é quando ele retoma o contato com o solo. Essa palavra vem, evidentemente, de terra, lugar onde preferimos andar.

Já se usou aterrar com o mesmo sentido, mas houve problemas. É que esse verbo já estava comprometido com dois outros significados, o de “encher de terra” e o de “assustar, aterrorizar”, este derivado do Latim terror, “medo, espanto, pavor”.

Enfim, Patty, algo me diz que sim, você terá uma carreira junto ao céu, mas não necessariamente como aeromosca.

Agora decolem todos e aterrissem em suas casas.

Resposta:

Origem Da Palavra