Palavra colusão

CONSPIRAÇÃO

 

Chego na aula e, em vez de ver meus queridos aluninhos reencenando as Guerras Púnicas, vejo-os quietos, separados em pequenos grupos, olhando para mim torvamente.

Pois saibam que vocês não me enganam. Meu faro fino detecta alguma coisa em andamento. E, quando vocês decidem fazer alguma coisa juntos, posso ter certeza de que não presta.

Em resumo, percebo que vocês estão fazendo algum tipo de conspiração. Naturalmente que vou colher a ocasião para ensinar a origem desta palavra e outras correlatas.

Esta vem do Latim conspiratio, “acordo, plano”, de conspirare, “concordar, unir, fazer um plano”, literalmente “respirar junto”, de com-, “junto” mais spirare, “respirar”. Gente que planeja ações nefastas, como é o caso aqui, tende a se aproximar para guardar segredo, é como se estivessem respirando o mesmo ar.

Podemos chamar essa atividade de conciliábulo. Ela é comprida e meio complicada, mas quer dizer a mesma coisa que “conspiração” atualmente. Mas começou a vida querendo dizer “reunião de sacerdotes heréticos, contrários aos dogmas da Igreja”.

Vem do Latim conciliabulum, “lugar de reunião, área pouco recomendável”, diminutivo de concilium, “grupo de pessoas reunido, assembleia, reunião de conselheiros”, de com, “junto”, mais calare, “chamar, conclamar”.

Já que estamos nessa área, lembramos que igrejinha tem um sentido semelhante, de grupo com ideias parecidas e que exclui os que pensam de outro modo. Naturalmente vem de igreja, do Grego ekklesia, “assembleia, reunião”, derivado do verbo ekkalein, formado por ek-, “fora”, mais kalein, “chamar, clamar”, que gerou o mesmo calare de que acabo de citar.

Sim, Lary? Como se chama a principal igreja de minha cidade de nascença? E esta agora, menina? Tudo o que você vai saber de mim é meu nome, não tem nada de saber onde nasci, o número de minha identidade e dos meus sapatos. Basta ficar com o que eu ensino.

Mudando de assunto, temos também o cambalacho. Liga-se a cambalear, fazendo metáfora com a oscilação de opiniões que gera uma conspiração. E “cambalear” veio do Grego kampe, “torto, curvo”.

E que me dizem de colusão? Não, Ledinha, eu não me enganei, não quis dizer “colisão” que nem a que aconteceu entre o carro de seu pai e a entrada da garagem. A palavra que usei é com “U” mesmo. Significa um acerto entre partes que estão aparentemente em litígio com a finalidade de lucrar de algum modo. Veio do Latim collusio, “conluio, conspirata”, de colludere, formada por com, mais ludere, “brincar, encenar”, de ludus, “jogo, brincadeira”.

Já que acabo de citar, conluio também vem de colludere.

Outra que tem esse significado é conjura. É do Latim conjurare, “prometer juntos, conspirar”, formada por com, mais jurare, “jurar, garantir”.

Como, Valesquinha? Sua madrinha fez o marido dela jurar que ele nunca mais iria estudar húngaro com uma ex-namorada porque os pegou… Está bom, não tenho tempo para responder agora porque preciso ensinar a vocês de onde veio arranjo, que é do antigo Francês arrangier, “colocar em ordem de batalha”, de a-, “para”, mais rangier, “dispor em fila”, de rank, “fila”, por sua vez de origem germânica.

Também ostenta o significado de “acordo de um grupo para prejudicar outrem”.

Agora vou falar numa que aposto que ninguém aqui conhece: malhoada. Quer dizer “intriga, enredo” e deriva do Francês maille, “malha”, do Latim macula, “mancha, nódoa”, porque nesse tipo de tecido os jogos de luz e sombra parecem determinar o surgimento de manchas.

Mas por que ligaram essa história de “enredo” e o tecido específico não me perguntem, nem mesmo eu sei tudo.

Para algumas pessoas prejudicarem outra é necessário haver conivência entre elas. Sua origem é o Latim connivere, “fechar os olhos como ao dormir”, formada por nossa velha conhecida com, mais nictare, “piscar”.

Agora me ocorre conventículo, “reunião clandestina, com propósitos sediciosos”, que obviamente vem de convento. E esta vem do Latim conventum, originalmente “reunião”, de convenire, “vir junto”, de com, “junto”, mais venire, “vir”.

Conchavo tem a mesma origem que conclave. E esta vem da expressão latina camera cum clave, “quarto chaveado”, literalmente “quarto com chave”. As reuniões para uma eleição papal são feitas na ausência de público, para não haver interferências externas na votação.

Historicamente há outro fator: no século XIII, quando da eleição do sucessor de Clemente IV na cidade de Viterbo, Itália, os cardeais se deslocavam livremente, entravam em disputas, participavam de festins, tudo menos eleger um Papa.

Demoraram quase três anos, tanto que que uns vinte cardeais morreram nesse intervalo. Cansado disso, o povo de Viterbo, dizem, fechou-os na catedral e informou que só sairiam dali após a eleição. E que passariam a pão e água até lá. Não demorou muito para ser obtido um consenso.

Depois disso as eleições papais passaram a ser chamadas conclave.

Espero que os meus cardeaizinhos aqui presentes, depois desta enxurrada cultural, tenham desistido de aprontar seja o que for para a sua querida Tia Odete.

Agora saiam para o recreio bem quietinhos.

 

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