Ué. Todos quietinhos por aqui, sentadinhos em seus lugares? Ninguém puxando cabelos alheios, mordendo orelhas, gritando ou sapateando? Parecem todos saudáveis, nem dá para pensar em alguma bendita epidemia que lhes drene a vitalidade antes de os levar ao hospital.
Bem, eu não sou de examinar as amígdalas ao cavalo dado. Além de os elogiar por este bom comportamento, vou começar a explicar de onde vem essa palavra. É do Latim comportare, “trazer junto”, formado de com-, “junto, com”, mais portare, “carregar, transportar”. Mais tarde adquiriu também o sentido de “arrumado, corretamente disposto, bem arranjado”.
Era assim que eu gostaria que vocês estivessem sempre, para poder ter uma folga do meu contato com os demônios que… Deixa para lá.
Essa palavra me lembra outra, que é gentileza. Esta deriva do Latim gentilis, “da mesma família ou clã”, de gens, “grupo de famílias definido no início da formação de Roma”, trazendo uma idéia de nobreza, de bem-tratar os outros.
Daí derivou também gentílico, (sinônimo: locativo) que é o nome dado à palavra que designa “origem”. Por exemplo, o nativo do Espírito Santo é capixaba, o de Buenos Aires bonaerense e assim por diante.
Podemos pensar também em cavalheirismo, “comportamento próprio de um cavalheiro”, do Latim caballarius, “cavaleiro”, de caballus, “cavalo”. Não, Valzinha, não queremos saber por que o seu tio Cícero é chamado de “cavalo” pelo resto da família nem as coisas que ele fez no último réveillon usando apenas cuecas e um balde na cabeça.
O que quero dizer é que um militar da cavalaria, em Roma, era uma pessoa de superior extração e, portanto, se devia esperar dele um comportamento cortês.
Palavra que, aliás, veio do Latim cors, originalmente “lugar cercado”, o que levou depois ao significado de “os que estão num pátio, companhia” e depois ainda “corte” – aqueles que estão nas cercanias do poder real.
Esperava-se também destas pessoas que tivessem maneiras refinadas e superiores. Nem sempre isso acontecia, mas a esperança humana nunca termina. Não fosse por isso eu teria desistido de ensinar há muito tempo.
Maneiras, por sua vez vem do Latim manuarius, “relativo à mão”, de manus, “mão”. Acabou adquirindo o significado de “modo de proceder, comportamento”, através da noção de “modo adequado de se fazer algo, método de manejar satisfatoriamente uma situação”.
Tudo isso é necessário para se poder viver em sociedade sem atritos. Tal palavra vem do Latim societas, “convívio mútuo, união”, de socius, “companheiro, camarada”, originalmente “seguidor”, do verbo sequi, “ir atrás, seguir, acompanhar”.
Outro derivado de sequi é sequaz, “o que faz parte de um grupo”, “parceiro de um criminoso”.
Não, Robertinho, “sequoia” não tem a mesma origem. O nome desta árvore – algumas das quais são os seres vivos maiores e mais antigos do mundo – deriva do nome de um índio Cherokee nascido ao redor de 1770. Vendo a escrita do homem branco e ficando fascinado por ela, ele fez, trabalhosamente e sem ajuda, um conjunto de sinais representando as sílabas do seu idioma, que é usado até hoje por esses indígenas.
As árvores fora nomeadas em homenagem a ele, que foi o único ser humano que realizou tal façanha sozinho.
De qualquer modo, viver juntamente com outras pessoas exige, entre outras qualidades, decoro, do Latim decorum, “decência, conveniência”, do verbo decere, “convir, ser adequado”, origem também de “decente”.
E não, Valzinha – você está impossível hoje – não queremos saber de exemplos de falta de decoro que ocorrem no seu edifício entre o síndico e a sogra do vizinho da frente, obrigada. Preferimos estudar e aprender.
Em sociedade é conveniente seguir a etiqueta, sem chegar ao exagero. Esta deriva do Francês antigo estiquette, “marcador”, que era o nome dado a pequenos impressos orientando sobre como proceder adequadamente na Corte.
Devia ser divertido ver uma pessoa menos conhecedora da conduta palaciana se escondendo atrás de uma cortina para poder consultar seus papeizinhos.
Bem, estranhamente chegou a hora de vocês saírem da aulinha e não precisei ter nenhum chilique nem gritar com ninguém nem separar nenhum par de gatos selvagens em briga.
Ainda não entendi nada, mas lhes dou os parabéns.