Palavra marrano

PORCO

 

Céus, o que esta espécie de abantesma toda melecada que passa aqui em minha frente, com o ar mais normal do mundo? Alguém pode me dizer antes que eu chame a Polícia, os Bombeiros, a Defesa Civil e a Liga da Justiça?

Como é? Ah, é o Arturzinho que estava com mais fome que o normal no recreio e acabou derramando suco, sorvete, iogurte, molho de cachorro-quente, maionese e outros alimentos indefinidos por cima do organismo. Certo. Essas coisas acontecem, principalmente com ele. Felizmente é a mãe dele que vai ter que dar um jeito em casa, não eu.

Não riam tanto, crianças, foi apenas um acidente.

Sentem em roda que eu, não sei por que, tive a súbita inspiração de falar sobre a etimologia de porco e seus derivados. Enquanto isso, Arturzinho, pegue estas
toalhas de papel e vá dando um jeito nesse seu aterrorizante aspecto.

Vejam, porco vem do Latim porcus, “porco, suíno doméstico”, do Indo-Europeu porko. Imaginem só: nos tempos das cavernas uma criança muito sujinha ia ser chamada por esse nome tal como agora!

Mas esse redondo e útil bichinho tem também outros nomes, como suíno, do
Latim sus, do Indo-Europeu su-, de mesmo significado.

Pode ser chamado de marrano ou marrão também. Essa palavra quase não se usa mais agora; cheguei a encontrar dicionários que não a apresentam, talvez por temor a serem considerados incorretos nesta época.

Essa palavra vem do Árabe al-mahram, “o que é proibido”, pois comer desse animal, considerado impuro, era proibido em determinadas religiões. Era aplicada, na Península Ibérica, como palavrão para designar judeus ou muçulmanos nos tempos em que eles eram perseguidos pelo  simples fato de não serem cristãos.

Felizmente deixamos isso bem para trás, mas nem por isso vamos fingir que não existiu.

Quando o porquinho está ainda em idade de mamar, ele se chama leitão, que vem de “leite”, que é o alimento que a Mamãe Porca lhe dá. E todos sabem de outras aulinhas que “leite” vem do Latim lac.

Usa-se muito no Espanhol a palavra cochino, para dizer porco, mas com caráter injurioso, insinuando que a pessoa se apresenta suja como aqui o… como… deixa pra lá.

Ela viria do som feito para chamar os redondos quadrúpedes, “Coch! Coch! Coch!” Vocês podem, depois que saírem, tentar gritar assim, para ver se aparece uma vara de porcos.

Parem! Parem já!! Depois que saírem, eu disse! De preferência em casa! Arre, crianças incontroláveis.

Ainda sobre esta palavra espanhola (mas que os franceses usam muito, como cochon): existe um insetinho bem pequeno, originário do México, que quando esmagado produz um corante vermelho que foi muito usado antes de serem descobertos produtos mais baratos através da Química. Por algum motivo, deram a ele o nome cochonilha, um diminutivo que significa “porquinho”.

Está certo, não gritem, concordo: ele não se parece em nada com um porco. Os seres humanos às vezes são esquisitos para escolher nomes.

Basta ver que, em Francês, a joaninha, aquele insetinho simpático e colorido, se chama vachette,”vaquinha”. Também não se pode dizer que elas apresentam lá muitas semelhanças físicas, mas esse é o nome popular delas.

Um lugar muito sujo se chama pocilga, uma alteração de porcilga, que veio de porcus.

A Valzinha aqui está levantando a mãozinha, certamente para acrescentar algo de interessante à aula ou para fazer uma pergunta inteligente…

Ah, eu devia ter sabido. Está bem, querida, o quarto do seu primo é chamado pocilga
pelo resto da família porque contém coisas que não queremos saber, e nem uma
menina de família como você deveria citar.

Vamos em frente, lembrando que as palavras porcaria e porquice são derivadas dos hábitos de higiene do suíno, que assombram o ser humano.

O pior é que eles não andam sujos por prazer; é que eles não têm glândulas sudoríparas. Isso  os leva a refrescar a pele com lama, o que não contribui para lhes dar um aspecto dos mais limpos.

Não podemos esquecer que desses animais o ser humano retira alimentos importantes e muito saborosos.

Por exemplo, o presunto. Deriva do Latim per sunctus, “através da secagem”, já que a carne é exposta à desidratação prolongada enquanto o tempero age.

Logo, fiquem sabendo todos que presunto não é apenas de porco, pode ser qualquer carne preparada de determinada maneira.

Quando um brasileiro vai a um país de idioma espanhol e quer comer um lindo sanduíche de presunto, precisa aprender a pedir com jamón. Esta palavra veio do
Francês jambon, de jambe, “perna”, que veio do Grego kampe, “curvo, articulação de um membro”.

Bem, agora voltem para seus lares. Espero que o Arturzinho volte bem limpinho amanhã e com menos fome também.

 

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