SÓLIDOS [Edição 82]

 

Boa tarde meninos, meninas, zumbis, abantesmas e outros seres que neste dia porventura se encontrem no recinto.

Hoje a Tia Odete não está para brincadeiras, portanto é bom todos se aquietarem e pensarem em se comportar como se fossem crianças normais e não criaturas vindas de um filme de ficção científica dos anos cinquenta.

Quero lhes mostrar, em primeira mão, uma coisa que vai incomodar as minhas colegas pedagogas. Sabem, aquela turma que diz que crianças não devem aprender a ler antes dos vinte e um anos, ou coisa parecida. E que, com isso, conseguem que elas não leiam nunca.

Olhem aqui, enquanto vou tirando da bolsa alguns objetos que fiz em casa mesmo, com cartolina, cola, tesoura e muita paciência.

Prestem atenção, que eu estou lhes apresentando os Sólidos Platônicos. Que assunto para o Maternal, hein?

Calma, depois vou falar sobre cada um. Mas antes vou contar que, uns quatro séculos antes de nossa era, havia um filósofo na Grécia que se chamava Arístocles. Mas ficou conhecido pela posteridade como Platão. Platon queria dizer “de ombros largos”. Não, Valzinha, ele não malhava, era assim de nascimento mesmo.

Ele usava muito a cabeça, como compete a um verdadeiro filósofo, e um belo dia descobriu algo muito interessante. Percebeu que, em nosso mundo tridimensional só existem cinco corpos, ou sólidos, que tenham faces iguais entre si.

Parem com essa agitação, ou eu não conto mais nada!

Essas crianças são difíceis de controlar, mas gostam muito de origens de palavras. Parece mentira que assim dê para lidar com elas.

Para começar, devo dizer que sólido vem do Latim solidus, “firme, completo, inteiro”.  Em Geometria, quer dizer uma figura que tem partes em todas as três dimensões de altura, largura e profundidade Ela é “limitada em todos os sentidos”, no jargão; mas não quebrem demais as cabecinhas com isso por ora.

Faustinho, quem lhe deu licença para ir à lousa e desenhar? Ah, você queria mostrar figuras geométricas. Desenhou rapidamente uma coisa que parece uma bolacha Maria amolecida e uma casa sem telhado esmagada por um terremoto…

Ah, trata-se de um círculo e um retângulo, é? Bem, mesmo dando um considerável desconto, reparem que essas são representações bidimensionais dessas figuras; elas não podem existir nesta nossa dimensão, só podemos dar uma ideia delas ao desenhar.

Olhem para meu material. Vamos começar com esta figura que lembra uma pirâmide, palavra que parece que vem do Egípcio pymar, “pirâmide” mesmo.

Pois este é o tetraedro, do Grego tetra, “quatro”, mais hedra, “assento, lugar que se ocupa, superfície”.

Isso, Valzinha, ele tem quatro superfícies triangulares iguais. Como você está esperta hoje!

Como? Foi porque esse é o número de namorados que pensa ter quando for maior? Ah, bem, tem gente que até tem bastante mais. Hein? Ao mesmo tempo? Tá bom, fique caladinha que senão eu não lhe mostro este aqui, que é o…

Não, senhores! Isto não é um quadrado! Um quadrado tem duas dimensões, isto é um cubo, do Latim cubus, do Grego kybos, “cubo, dado, vértebra”. E tem também um nome menos leigo, que é hexaedro, do Grego hexa, “seis”, mais hedra.

O que ele tem de quadrado são as faces, todas iguaizinhas.

Antes que a Valzinha tenha outras idéias sobre namorados, vou apresentar o octaedro, de octa, “oito”, mais… Está bem, Patty, não precisava gritar que agora vinha o hedra. Aliás, em homenagem a você, não vou mais citar essa palavra nesta aula. Agora feche a boquinha e preste atenção.

Olhem para ele aqui, ele lembra duas pirâmides grudadas pela base.

Certo, Aninha, ele é formado por dois tetraedros. Que turma que está atenta hoje! O que terá acontecido?

E apresento para vocês, saindo diretamente de minha bolsa que já está tão velha, coitada, que mereceria ser substituída se certos aluninhos se reunissem para comprar uma nova, mas não pensem que estou dando idéias… Onde é que eu estava mesmo? Ah, sim, ia mostrar o dodecaedro. Olhem só, ele tem apenas faces pentagonais e lembra uma bola de futebol sem curvas.

Ele tem doze faces, do Grego dodeka, “doze”. Quieta, Patty!

E agora o irmão mais complexo dos cinco, o icosaedro, com vinte faces, do Grego eícosi, “vinte”.

Calma, Lary, fale mais devagar. Quer saber se inventaram já os sólidos não-platônicos? Claro que sim, menina.

Por exemplo, temos o cone, que é a forma aproximada de uma casquinha clássica de sorvete. Essa palavra vem do Grego konos, “pinha”, pela forma.

O cilindro vem do Grego kýlindros, , “rolo”, ligado a kýlindein, “rolar”.

O paralelepípedo deriva do Grego parallelepipedon, “corpo com superfícies paralelas duas a duas”, de parallelos, (de para allelois, “um ao lado do outro”, de para-, “ao lado”, mais allos, “outro”), mais epipedon, “plano” (de epi-, “sobre”, mais pedon, “chão, piso”). Complicada de explicar esta, não?

E por hoje é só, quem comeu regalou-se, quem não comeu ficou com fome.

 

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