Valei-me, Nossa Senhora das Situações Desesperadas! Mal entro em minha aula, na qual acabei dando com os costados devido à minha romântica idéia de formar pequenas mentes, e vejo este cenário desolador.
Dois aluninhos dançando sobre minha mesa, um pendurado numa luminária por um cinto, outros pulando sobre cadeiras, diversos correndo para lá e para cá como se fossem bolas de mercúrio, todos emitindo gritos e roncos que lembram…
Já sei. Sentem-se aqui e vamos falar sobre um simpático tipo de animalzinho que atende pelo nome de primata. É uma ordem da classificação zoológica que recebeu esse nome do Latim primates, plural de primas, “principal”, de primus, “primeiro”. Quando Lineu começou a classificação dos animais, ele considerou que os humanos e outros mamíferos a eles assemelhados constituíam as espécies mais evoluídas e achou que esse nome seria adequado. De minha parte, tenho dúvidas.
Há muitos primatas além de nós, como o mico, por exemplo. Ele recebeu seu nomezinho do Caribe miku, que era como eles o chamavam.
Outro desses, menorzinho, é o sagui, do Tupi sa’gwi. Não se esqueçam de que a palavra não leva mais trema.
Indo para outro lado em tamanho, lembrei-me do gorila. Essa palavra tem uma história cheia de voltas. Lá pelo ano 500 de nossa era, um navegador cartaginês que atendia pelo nome de Hanno se meteu a explorar o noroeste da África. Explorando uma ilha, ele e seus homens depararam com um grupo de seres muito cabeludos, que foram chamados de gorillai pelos guias.
Este nome foi citado no livro em que ele descreveu seus feitos, chamado Périplo. Em 1847, um missionário e explorador americano o aplicou aos primatas que haviam sido descobertos há pouco pela civilização ocidental na Libéria.
Sim, Valzinha? Quer saber o que aconteceu depois do encontro com os marinheiros? Estes tentaram capturar alguns gorillai e conseguiram pegar três fêmeas. Como elas não paravam de lutar, mataram-nas e lhes tiraram a pele.
As expedições científicas naquelas épocas não eram lá das mais corretas quanto aos seus métodos.
Para piorar, não se sabe se os tais gorillai encontrados pelos cartagineses eram gorilas ou seres humanos.
Antes que eu me esqueça, deixem-me explicar que gorilas, seres humanos, chimpanzés e orangotangos fazem parte de um grupo chamado antropoides. Esta palavra foi feita a partir do Grego anthropos, “homem”, mais oeides, “semelhante a”.
Já que citamos, vou explicar que chimpanzé vem de um dialeto Banto, o Tshiluba, onde era kivili-chimpenze, “macaco”, mais exatamente “semelhante ao homem”.
Sim, Robertinho, já notei que eles criaram uma palavra de acordo com os princípios de antropóide, que expliquei acima. Não, Robertinho, não foram eles que descobriram a Grécia. Nada impede povos diferentes de criar palavras semelhantes, seu moço. E agora aquiete-se para eu poder contar que eles são os seres vivos geneticamente mais próximos do Homem.
Eu mesma, olhando para o comportamento de certos aluninhos, permito-me discordar com frequência.
Passando para coisas menos assustadoras, vejamos a origem de orangotango.
Ela nos veio do Holandês orang-outang, do Malaio orang utan, “homem da floresta”, de orang, “homem”, mais utan, “floresta, lugar selvagem”.
Aqui pode ter acontecido que o termo, no seu início, se tivesse referido a tribos distantes, homens verdadeiros que viviam na floresta, e que os europeus tenham entendido mal o que os habitantes locais diziam.
Temos também a palavra macaco, que passou do Português para outros idiomas. E que veio para o nosso a partir do Banto makaku, uma forma de kaku, “macaco”.
Temos um nome bastante genérico para nos referir a essa turma, que é símio.
Sim, Ledinha? Se tem a ver com o Seu Simão, o seu encanador? Pois até pode. Símio veio do Latim simus, “nariz chato”, do Grego simós, de mesmo significado.
E o nome desse senhor é dado por alguns como tendo essa origem, embora outros digam que ela é hebreia e queira dizer “Ele ouve”.
Em nossas florestas vive o bugio ou guariba. Ele é conhecido pelos seus gritos potentes, o que os faz serem chamado em Inglês de howlers, “gritadores”.
O primeiro desses nomezinhos vem do Árabe budjia. Mas não perguntem à pobre Tia Odete por que foram eles que deram o nome. Em seus estudos ela não conseguiu descobrir a razão, já que esses primatas vivem só na América Central e do Sul.
O outro nome vem do Tupi gwa’riwa, que era como eles chamavam o macaco.
Na África existem os perigosos babuínos, assim nomeados a partir do Francês babouin, uma variante de baboue, “fazer caretas”, porque eles se dedicam a essa atividade quando uma situação lhes desagrada.
O que é comum a todos os macacos, aliás. E parem já de fazer caretas! Senão eu vou chamar o pessoal do Zoológico e vender uma bela carga de babuininhos jovens e ficar rica.
Um parente próximo do babuíno é o mandril. Certo, Lary, seu pai tem um mandril entre as suas ferramentas, mas não é desse que vamos falar. Eu me refiro à palavra que foi formada pelo Inglês man, “homem”, mais drill, o nome deste macaco na África, de origem desconhecida.
É interessante saber que o mandril macho é conhecido por ser o mamífero mais colorido que existe. Ele tem cores vivas no rosto e no traseiro e não vamos mais falar nisso porque a Tia Odete é uma pessoa muito recatada.
A ferramenta que o pai de Lary usa deriva do Francês mandrin, “eixo de ferro”, do Provençal mandre, “manivela”, do Latim manus, “mão”. Nada a ver.
Na língua inglesa se faz uma distinção que não existe em Português. É entre ape, que vem do Inglês antigo apa, do Germânico affo, e designa os macacos sem cauda.
Eles reservam monkey para os macacos portadores de cauda. Essa palavra vem provavelmente de um Germânico moneke-, originalmente o diminutivo de um termo de origem latina que acabou no Espanhol mono, “macaco”.
Bem, prezados exemplares simiescos, agora podem ir para casa. Em outra ocasião a Tia Odete vai falar sobre outros primatas como os lêmures, társio e outros.
Favor não tentarem subir nas árvores do pátio.