Palavra santuário

Tia Odete Pede Socorro

– Pelas barbas de todos os profetas e mais alguns! A destruição da espécie humana tinha que começar pela minha cidade e, mais especificamente na minha aulinha, na minha presença!

Cri-an-ças!! Aquietem-se! Parem de destruir a sala, a minha paciência e uns aos outros! Ai, ai, vou ter que apelar para os meus santos de novo.

São Januário que me dê santuário! São Rodrigo que me arranje abrigo! São Duarte que me faça um baluarte, São Sebastião me erga um bastião, Santa Amália que levante uma muralha, perdoando a má rima! Santa Graziela, levai-me para vossa cidadela! São Cirilo, dai-me asilo! Santo Antão, fornecei-me proteção!

Aninha e Tiago, desçam da mesa; Valzinha, pare de falar; Patty, pare de sacudir tudo ao seu redor; Vera, pare de procurar confusão; Claudia, você é nova aqui, não aprenda nada com os seus coleguinhas; Lúcia, pare de ser tão comportada senão você vai ser beatificada ainda em vida.

Larguem tudo e reúnam-se aqui, que quando vocês estão assim só hipnotizando-os com Etimologia.

Estas palavras que bradei em meu desespero ao ver cenas de selvageria explícita que ferem meus delicados sentidos se referem a lugares de defesa contra coisas desagradáveis.

Para começar, falei em santuário, que vem do Latim sanctuarium, “local sagrado, altar”, de sanctus, “santo, sagrado, abençoado”. Na Idade Média, na Europa, um fugitivo ou devedor que entrasse numa igreja não podia ser preso.

Não sei se tiveram a idéia de fazer algo no estilo pelas pobres professoras. Bem que podiam começar.

Depois falei em abrigo, que vem do verbo latino apricare, que queria dizer “tomar sol, defender-se do frio estirando-se ao sol” e, por extensão, “defesa, cuidados”.

Como é, Valzinha? Ahn, uma vizinha lá do seu conjunto gosta muito de tomar sol na sacada do apartamento? Ora, e daí? Ah, sem vestir nada… Bem, decerto ela é muito friorenta e – não, não quero saber o que foi que o marido dela fez quando voltou antes da hora para casa e encontrou um vizinho passando filtro solar nela.

Vamos mudar de assunto e falar em baluarte, originado do Provençal baloart, “muralha”, que veio do Holandês bolwerc, “muro de uma fortificação”, formado por bole, “tronco de árvore”, mais werc, “trabalho, preparação”. Se eu tivesse um baluarte para me proteger de certas condutas alheias seria muito bom.

Um sinônimo pode ser muralha, que vem do Latim murus, “muro de cidade”. Elas eram erguidas para manter os bárbaros do lado de fora, ai que linda idéia!

Mas ainda não inventaram as muralhas portáteis, de modo que eu vou lhes dizer que cidadela quer dizer “fortaleza que defende uma cidade” e veio do Italiano cittadela, “pequena cidade”, de città, “cidade”, do Latim civitas, “cidade”. Naturalmente, as pessoas que habitavam uma cidade eram os cidadãos.

Uma palavra com o mesmo significado de cidadela, aplicada especialmente à cidade de Atenas, é acrópole, de akropolis, formada por akros, “mais alto”, e polis, “cidade”. Esse conjunto de templos ainda existe lá sobre um morro, em ruínas, mas ainda espantando pela sua beleza. Gostaria muito que vocês todos fossem lá passear.

Agora, neste instante, aliás.

Por sua vez, bastião vem do Italiano bastione, aumentativo de bastia, “fortaleza”, que vem de bastare, “ser suficiente, suportar, bastar”, do Grebo bastazein, “erguer um fardo”. Eu bastazo todos os dias de trabalho… E ainda tenho pesadelos em casa!

Olha aí, até Grego estou falando. E vou colher o ensejo de dizer que asilo, que eu gostaria tanto que a ONU me concedesse, vem do Grego asylon, “refúgio”, de asylos, “inviolável” – não, Robertinho, não tem nada que ver com violetas – que se forma de a-, “não”, mais syle, “direito de prender”.

E já que falei em refúgio, essa palavrinha vem do Latim refugere, “fugir” formado por re-, intensificativo, mais fugere, “fugir”. E proteção vem do Latim protegere, “defender, proteger”, formado por pro, “à frente”, mais tegere, “cobrir”, de tegula, “telha”.

Olha, está tocando o sinal para que vocês se retirem, graças aos meus bons santos. Antes de sair, quero informar que retiro, coisa que eu deveria fazer por um bom tempo, vem do Latim retirare, “puxar, tirar”, formado por re-, “para trás”, mais tirare, “puxar”.

Agora retirem-se todos para que eu possa ter meu infarto em paz.

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