BICICLETA
Cheguei muito orgulhoso, empurrando minha primeira bicicleta, no gabinete do meu avô, que ficava no fundo do seu pátio. Ele saiu à porta para me receber.
– Olha só, Vô! Esta é a minha bicicleta!
– Ora, parabéns, menino! É muito bonita.
– Já que o senhor gostou dela, pode me dizer algumas coisas sobre as partes dela?
– Você vai longe com esse desejo de aprender, meu neto. E, como eu gosto de ensinar, formamos uma bela dupla. Vamos ver então: a própria palavra bicicleta veio do Latim bis, “dois, duas vezes”, mais o Grego kyklos, “redondo”. Isso porque tem duas rodas, já reparou?
– Então o triciclo que o senhor me deu quando eu tinha dois anos se chama assim porque tem três rodas?
– Exatamente. E roda vem do Latim rota, o nome do objeto.
– Esta tem um monte de varetas de metal, como é mesmo o nome delas?
– Raios. Veio do Latim radius, “vareta de roda, bastão, raio de luz”.
– Tem algo a ver com os raios-X?
– Sim. Estes receberam o nome porque, ao serem descobertos, sabia-se que se tratava de uma forma de emissão de radiação, como os raios do sol. Mas, como eram ainda algo misterioso, ganharam o “X” como símbolo de uma incógnita.
Veja que ao redor da roda há os pneus, palavra que vem a ser um encurtamento do Francês pneumatique, “pneumático”, ou seja, “cheio de ar”. Deriva do Grego pneuma, “ar, vento, sopro”.
E preste atenção nestes apoios onde você coloca os pés para impulsionar essa geringonça: são os pedais, do Latim pes, “pé”.
– Então onde eu ponho as mãos para guiar esta belezinha se chama manual?
– Quase. O nome é manúbrio, e vem do Latim manus, mão. Aliás, falando em mãos e pés, desde já vou avisando que você precisa andar equipado para evitar acidentes.
Tem que usar capacete, que nos veio do Espanhol capacete, “peça de proteção para a cabeça”, do Latim capaceum, derivada de capere, “conter”.
E também cotoveleira, do Latim cubitus, “cotovelo”. Para não falarmos da joelheira, do Latim genu, “joelho”.
– Chii, vou ter que dizer isso para meus pais…
– Não lhes diga, eu e sua avó vamos lhe dar logo de presente esse material.
– Muito obrigado, Vô! – e aproveitei para abraçá-lo.
– Não agradeça, é só porque eu não quero ter que cuidar de um neto com fraturas. Mas, voltando à etimologia da bicicleta, ocorre-me contar que o selim, onde a pessoa senta, vem de sela, do Latim sella, de sedes, “assento, lugar para sentar”.
E, para evitar bater contra alguma coisa, existem o freios, do Latim frenum, o nome da peça bucal que se usa nos cavalos para controlar sua direção e velocidade. Mantenha-os sempre em bom estado.
– Não vou esquecer.
– E não se esqueça de olhar sempre aqui, no espelho. Esta vem do Latim speculum, “espelho”, de specere, “olhar”. Olhar para trás é outra forma de evitar acidentes.
Há outro equipamento que é indispensável para andar à noite: são estas coisinhas coloridas aqui, os catadióptricos.
– Hã?
– Sim, eu sei que é muito complicado para uma cabecinha oca que nem a sua, mas essa palavra vem do Grego kata–, aqui querendo dizer “de volta”, mais dioptra, “instrumento óptico” em Latim. São os populares olhos-de-gato. Ou, para simplificar, refletores. E esta palavra, por sua vez, vem do Latim re-, “outra vez, novamente”, mais flexus, “dobrado, fletido”, do verbo flectere, “dobrar”.
Se alguém vai andar à noite de bicicleta, que seja em local sem maiores perigos. Nesse caso, é bom instalar também um farol, cujo nome vem da ilha de Pharos, em Alexandria, Egito.
Esse farol terá uma lâmpada, que vem do Grego lampein, “brilhar”.
– E esta parte da armação aqui, feita de tubos?
– Esse é o quadro, do Latim quadrum, “o que tem quatro lados”, de quattuor, “quatro”.
– Ué, mas este é triangular e não tem pintura dentro!
– Certo. Mas alguém achou que havia similaridades e escolheu esse nome, que acabou pegando. No duro, parece-me que chamar de “moldura” seria mais adequado.
– E estas rodas dentadas aqui junto ao pedal?
– São as engrenagens; esta vem do Francês engrener, “encaixar rodas dentadas”, também “colocar grãos para serem moídos”, do Latim granum, “grão’. Veja você as voltas que uma palavra dá em suas alterações ao longo do tempo.
E note que, encaixando nas engrenagens, está a correia, do Latim corrigia, “tira de couro, açoite”.
Mas bem, antes que eu me canse de falar muito e queira lhe aplicar uma correia, vamos sair para comprar aqueles seus equipamentos. Deixe a sua bicicleta aqui, que doravante você só subirá com eles postos.
– Vô… obrigado de novo!